A esquerda é um lixo mesmo

Scripta Nova
REVISTA ELECTRÓNICA DE GEOGRAFÍA Y CIENCIAS SOCIALES
Universidad de Barcelona. 
ISSN: 1138-9788. 
Depósito Legal: B. 21.741-98 
Vol. XI, núm. 245 (16), 1 de agosto de 2007
[Nueva serie de Geo Crítica. Cuadernos Críticos de Geografía Humana]

Número extraordinario dedicado al IX Coloquio de Geocritica

A ESQUERDA NO PODER LOCAL: PORTO ALEGRE E O PARTIDO DOS TRABALHADORES


Mario Leal Lahorgue
Departamento de Geografia
Universidade do Extremo Sul Catarinense (UNESC)

A esquerda no poder local: Porto Alegre e o Partido dos Trabalhadores (PT) (Resumo)

Quais s�o os limites que um Partido de esquerda encontra quando se encontra administrando uma cidade inserida numa conjuntura onde o modo de produ��o de mercadorias � dominante? A partir de um exemplo brasileiro, se examina as pol�ticas urbanas implementadas pelo Partido dos Trabalhadores na cidade de Porto Alegre (RS � Brasil), entre os anos de 1989 e 2004, per�odo no qual este Partido governou a cidade em quatro administra��es sucessivas. Portanto, busca-se aqui uma compreens�o geral sobre pol�ticas p�blicas implementadas nesta metr�pole brasileira e seus efeitos sobre o espa�o urbano e sua popula��o, n�o se limitando �s tradicionais discuss�es sobre o Or�amento Participativo, largamente debatido quando se fala em Porto Alegre e Partido dos Trabalhadores. Este trabalho apresenta a s�ntese de algumas id�ias desenvolvidas na Tese de Doutoramento conclu�da pelo autor em 2004 na UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).

Palavras-chave: Espa�o urbano; poder local; pol�ticas urbanas; administra��o municipal; Partido dos Trabalhadores (PT).

  The left on the local power: Porto Alegre and the Worker�s Party (PT) (Abstract)

Which are the limits that a left-wing party finds when it�s managing a city inserted in a conjuncture where the dominant mode of production is the capitalism? From a Brazilian example, it examines the urban policies implemented by the Workers� Party in the city of Porto Alegre (RS - Brazil), between the years of 1989 and 2004, period in which this Party governed the city in four successive administrations. Therefore, this text is looking for a general understanding on the implemented public policies in this Brazilian metropolis and its effect on the urban space and its population, not limiting to the traditional discussions on the Participatory Budgeting, widely debated when Porto Alegre and Workers� Party are focused. This work presents the synthesis of some ideas developed in the PhD Thesis concluded by the author in 2004 at the UFSC (Federal University of Santa Catarina).

Key-words: Urban space; local power; urban policies; municipal government; Workers� Party (PT).

Porto Alegre, cidade no sul do Brasil centro de uma metr�pole com mais de 3 milh�es de habitantes, teve durante 15 anos uma experi�ncia �nica, se considerarmos as particularidades da pol�tica brasileira. A partir de 1989, e por quatro administra��es sucessivas at� 2004, o Partido dos Trabalhadores (PT) governou o munic�pio, introduzindo inova��es como o Or�amento Participativo, apoiando a realiza��o do Forum Social Mundial e se tornando um dos focos do debate sobre as possibilidades da esquerda nas transforma��es em escala local.

Ao contr�rio de outras grandes cidades brasileiras, onde partidos de esquerda raramente conseguem ficar no poder mais de quatro anos (o per�odo de mandato entre uma elei��o e outra), o longo tempo em que o PT se manteve no poder local evidenciou uma maneira de se entender a cidade e o urbano sendo posta em pr�tica. Visto a partir de um �ngulo mais gen�rico, existiu a pr�tica de um partido de esquerda no gerenciamento de uma cidade capitalista. Quais s�o os limites desta pr�tica neste contexto? Visto agora por um �ngulo mais espec�fico, quais s�o os limites das pol�ticas urbanas implementadas pelo PT em Porto Alegre?

Antes de prosseguir, se faz necess�rio alguns esclarecimentos. O primeiro diz respeito ao que est� sendo considerado aqui poder local. No �mbito deste trabalho, poder local est� circunscrito ao territ�rio do munic�pio, sendo a principal express�o deste poder o governo municipal, especialmente o poder executivo (Prefeitura). O segundo diz respeito � quest�o dos limites do poder local. Evidentemente, existem limites jur�dicos, de distribui��o de compet�ncias entre os poderes municipal, estadual e nacional, al�m de compet�ncias diferentes entre o legislativo, executivo e judici�rio. N�o � disso que se trata aqui. A quest�o � como a cidade foi administrada pelo Partido dos Trabalhadores dentro das possibilidades e barreiras existentes na l�gica de acumula��o de capital, na qual o urbano tem um papel bastante significativo. O terceiro esclarecimento � sobre o uso do termo esquerda. Desde que a coaliz�o liderada pelo PT venceu as elei��o nacionais em 2002 e Luis In�cio Lula da Silva se tornou Presidente do Brasil, muitos tem questionado se o PT realmente continuaria sendo um partido de esquerda. Esta discuss�o n�o ser� feita. Este texto parte do princ�pio que, na pr�tica, a administra��o petista em Porto Alegre foi de esquerda. O conceito de esquerda aqui utilizado se assemelha � defini��o de Bresser-Pereira (2006:26-27):

A direita � o conjunto de for�as pol�ticas que, em um pa�s capitalista e democr�tico, luta sobretudo por assegurar a ordem, dando prioridade a este objetivo, enquanto a esquerda re�ne aqueles que est�o dispostos, at� certo ponto, a arriscar a ordem em nome da justi�a � ou em nome da justi�a e da prote��o ambiental, que s� na segunda metade do s�culo XX assumiu estatuto de objetivo pol�tico fundamental nas sociedades modernas. Adicionalmente, a esquerda se caracteriza por atribuir ao Estado papel ativo na redu��o da injusti�a social ou da desigualdade (�)

Assim, estou englobando no conceito de esquerda n�o s� grupos revolucion�rios, que pretendem substituir o capitalismo pelo socialismo, mas tamb�m a parcela que pode ser chamada de social-democrata, pois pretende instituir reformas no sistema sem necessariamente substitu�-lo.


O que pode o poder local?

Em um trabalho recente, Carlos Vainer (2002) apresenta uma pergunta b�sica semelhante � que norteou a pesquisa que deu origem a este texto. A pergunta, �o que pode o poder local?�, n�o tem como base um estudo de caso espec�fico, mas procura apresentar um contraponto � �mercadotecnia� e �s �cidades em competi��o� defendidas por autores como Borja e Forn (1996) ou Borja e Castells (1996).


Vainer (2002:29) coloca que � poss�vel romper com o �fatalismo do pensamento neoliberal�, desde que se parta do pressuposto que a pol�tica local deva ser concebida como parte de uma �estrat�gia transescalar� (ou seja, � imprescind�vel articular a escala local com outras) e tenha como objetivos:

 a redu��o das desigualdades e melhoria das condi��es de vida das classes e grupos sociais oprimidos e explorados, principalmente atrav�s da transfer�ncia de recursos em seu favor;

o avan�o e radicaliza��o de din�micas (sociais, pol�ticas, culturais) que propiciem a organiza��o e a luta populares;

 o enfraquecimento dos grupos e coaliz�es dominantes atrav�s da desmontagem de mecanismos tradicionais de reprodu��o de poder e a desarticula��o de alian�as e dispositivos que favore�am a privatiza��o de recursos p�blicos.

Pois bem; o objetivo aqui n�o � discutir as teses deste autor, mas usar estes enunciados como um ponto de partida para a discuss�o sobre Porto Alegre. A raz�o provavelmente j� tenha sido notada pelo leitor que conhece pelo menos um pouco a cidade: as pol�ticas implementadas ao longo desses 15 anos na capital ga�cha pelo Partido dos Trabalhadores sempre foram pautadas por objetivos muito semelhantes aos citados acima. Vide o Or�amento Participativo e seu �efeito redistributivo�, al�m do pr�prio processo do OP como uma �nova forma de poder�; a desarticula��o de pr�ticas clientelistas tradicionais, entre outras. Consequentemente, se estes objetivos podem (pelo menos parcialmente) ser encontrados em Porto Alegre, a quest�o agora � discutir os limites destas estrat�gias como uma contraposi��o ao neoliberalismo.

Para isto � necess�rio que se parta de um entendimento mais geral. Portanto, um �limite gen�rico� pode ser apontado: as rela��es capitalistas n�o est�o limitadas �s fronteiras territoriais do munic�pio; logo, existem componentes estruturais que n�o s� n�o podem ser modificados na escala local, mas tem o poder de produzir o espa�o quase � revelia tanto do governo municipal quanto das for�as pol�ticas locais. E isto coloca um problema para os Partidos de esquerda que aceitaram as regras da democracia formal, ganharam elei��es e se encontram administrando cidades no contexto capitalista: o que pode ser feito na escala local?

Algo que � frequentemente esquecido quando alguns analistas tentam mostrar a pretensa novidade da globaliza��o � que o desenvolvimento do capitalismo, pelas pr�prias caracter�sticas do processo de acumula��o, sempre foi um movimento de quebra de barreiras espaciais, de expans�o. O processo de acumula��o sempre foi ao mesmo tempo um processo de incorpora��o de novos territ�rios dentro da l�gica capitalista, seja no in�cio unificando o espa�o pulverizado do feudalismo em estados nacionais, seja atrav�s do �com�rcio mundial� ou da implanta��o mais recente de unidades fabris (as empresas transnacionais) nos mais diferentes pa�ses do globo.

Al�m disso, esta unifica��o do espa�o carrega ao mesmo tempo a transforma��o de praticamente tudo em mercadoria: n�o s� as coisas produzidas nas f�bricas, mas a for�a de trabalho e o pr�prio ambiente constru�do. Dito de outra maneira, passa a predominar o valor de troca em detrimento ao valor de uso e a pr�pria cidade vira valor de troca, como j� lembrava Henri Lefebvre (1976 e 1978).

Se genericamente existe a unifica��o do espa�o como um requisito da acumula��o, isto n�o significa que territ�rios particulares, nas mais diversas escalas, n�o tenham diferen�as. No exemplo mais �bvio, n�o existe ind�stria em todos os pontos do planeta, nem mesmo em todas as cidades de um mesmo pa�s. De forma semelhante ao trabalho, o espa�o � abstrato, homogeneizado, se comporta como equivalente (o que ajuda a explicar as disputas das municipalidades por ind�strias, a competi��o entre cidades) e ao mesmo tempo � concreto, pois a particularidade (produzida) do lugar significa formas e possibilidades diferentes no processo gen�rico de acumula��o.

A particularidade do local ent�o, pode tanto servir como est�mulo a investimentos diversos de capitais quanto servir para estrat�gias diferenciadas na luta por um ambiente constru�do que n�o sirva unicamente � acumula��o.

O processo de valoriza��o necessita criar uma ampla gama de estruturas que imobilizam o capital, uma paisagem f�sica, um ambiente constru�do, um capital fixo. As cidades s�o as melhores representa��es disso, s�o espa�os produzidos, configura��es particulares de uma forma de produzir e consumir. Em outras palavras, o urbano � uma coer�ncia estruturada, para retomar David Harvey (1989). O que significa que n�o � t�o f�cil a mudan�a de fluxos de investimentos de uma regi�o para outra, de um lugar para outro. A imobiliza��o de uma quantidade enorme de capital como ambiente constru�do faz com que o capital tamb�m seja interessado (pelo menos at� um certo ponto) na continuidade do urbano existente. Isto ajuda a explicar alian�as de classe em defesa da cidade atrav�s da mobiliza��o de sentimentos de comunidade e solidariedade em rela��o ao lugar, a cria��o (artificialmente ou n�o) de um sentimento de pertencimento.

Por conta disso, �a redu��o das desigualdades e melhoria das condi��es de vida das classes e grupos sociais oprimidos e explorados� n�o significa necessariamente algo contr�rio aos interesses burgueses, pois isto pode refor�ar uma regi�o ou cidade como local atraente aos investimentos capitalistas.

Evidentemente, a proposta aqui n�o � apostar no �quanto pior melhor�. � perfeitamente �justo� e moralmente defens�vel melhorar as prec�rias condi��es de vida das classes exploradas, principalmente no Brasil. A quest�o �: o objetivo de um partido de esquerda � fazer somente isso? Faz parte das estrat�gias dos defensores do city marketing e da competi��o entre as cidades (ver como exemplo os j� citados Borja e Castells) preservar e estimular modelos de produ��o e consumo, n�veis de lucro e sal�rios e a pr�pria infraestrutura f�sica e social. Pois n�o � exatamente isto que a maior parte das pol�ticas urbanas do PT em Porto Alegre fizeram? Vejamos.

As pol�ticas urbanas do PT em Porto Alegre

As administra��es do partido melhoraram as condi��es sanit�rias (da cidade) e de sa�de (da popula��o): a extens�o da rede de �gua e esgotos fez parte dos programas de governo desde a primeira gest�o do PT. Alguns dados b�sicos demonstram isso: pelas informa��es dos Censos do IBGE, a propor��o de domic�lios particulares permanentes com saneamento inadequado (ou seja, sem rede de abastecimento de �gua, esgotamento sanit�rio e coleta de lixo) em Porto Alegre caiu de 1,3 por cento em 1991 para 0,2 por cento em 2000. Em 2001, 99,5 por cento da popula��o da cidade era atendida pela rede de abastecimento de �gua; a coleta de esgoto chegava a 84,2 por cento. Deve ser ressaltado que os pouco mais de 84 por cento de coleta de esgoto se refere tanto ao esgoto que recebe tratamento quanto ao simplesmente coletado (usualmente redes mistas pluviais/cloacais). O problema � que a base inicial de tratamento de esgoto era bastante baixa: em 1989, apenas dois por cento do esgoto era tratado na cidade. Assim, entre 1989 e 2002 foram constru�das cinco novas esta��es de tratamento, aumentando para 27 por cento a popula��o atendida com este servi�o. A meta, n�o atingida, era estender para 77 por cento o servi�o de tratamento secund�rio de esgotos. Existe um projeto j� h� bastante tempo que pretende atingir esta meta; como � um projeto complexo e de grande porte, ainda est� esperando por fontes de financiamento (o que, n�o pode ser esquecido, lembra da quest�o das limita��es municipais).

� preciso levar em considera��o mais uma coisa: os n�meros gerais de abastecimento de �gua e esgoto se tornam um pouco diferentes quando se examina a situa��o dos domic�lios localizados em �reas irregulares. Dos 73.331 domic�lios portoalegrenses em vilas ou n�cleos irregulares, 94 por cento contam com rede de �gua e 64 por cento est�o conectados a algum tipo de rede de esgotos. Neste caso, ainda h� muito por fazer (e a ser demandado pelos participantes do OP).

A men��o � irregularidade de moradias em Porto Alegre remete a outro importante item da �pol�tica social�, a quest�o habitacional. Antes de tudo, o que foi feito no per�odo de 1989 a 2002: o DEMHAB (Departamento Municipal de Habita��o) contabilizou cerca de 12.000 unidades habitacionais entregues com infraestrutura completa, contando a� reassentamentos, assentamentos no mesmo local e novos loteamentos.

O que a primeira vista pode parecer um n�mero razo�vel, quando confrontado com outros dados mostra uma realidade n�o t�o r�sea. Segundo os censos do IBGE de 1991 e 2000, a situa��o na cidade era a seguinte: o n�mero de domic�lios no ano de 1991 em situa��o de faveliza��o/subabita��o era de 33.436; no ano de 2000 foram encontrados na mesma situa��o 39.816 domic�lios (ou 19,1% de aumento). Considerando o n�mero de pessoas vivendo em situa��o favelada, haviam 136.410 em 1991 e 143.292 em 2000. Ou em outras palavras, o n�mero de pessoas vivendo em condi��es prec�rias na cidade cresceu durante a d�cada de 90 a taxas maiores que o pr�prio crescimento demogr�fico do munic�pio, que foi de 0,91 por cento de crescimento anual e de 7,6 por cento no per�odo. De posse destes n�meros, nem � preciso uma pesquisa muito aprofundada para se chegar a conclus�o que a faveliza��o na d�cada de 90 � um fen�meno muito mais �interno� (no sentido que atinge pessoas que j� viviam em Porto Alegre), associado a desemprego e queda de renda do que algo ligado � migra��es em dire��o �s metr�poles, por exemplo. E aqui n�o importa considerar as diferen�as de metodologia entre a prefeitura e o IBGE - que resultaram em n�meros diferentes[1] -, mas ressaltar que a pol�tica habitacional da prefeitura durante a gest�o do PT est� bem distante de equacionar o problema.

Mesmo assim, � importante mencionar que os governos da �administra��o popular� mudaram, pelo menos parcialmente, a forma de encarar o problema da subabita��o. Como j� � bastante conhecido daqueles que estudam o processo de urbaniza��o brasileiro, em Porto Alegre (ali�s, em todas as cidades do pa�s) tradicionalmente e sem exce��o, a maneira de resolver o problema das favelas era erradic�-las atrav�s de uma remo��o seja para a periferia ou mesmo munic�pios lim�trofes. Um exemplo: Entre os anos de 1971 e 1976 foram removidas 7.744 fam�lias: 1.273 (16,4%) para a Restinga Velha distante 28,4 quil�metros do centro da cidade; 747 (9,7%) para a Restinga Nova; 1.246 (16,1%) para outras vilas de Porto Alegre e 4.478 (57,8%) para outras �reas da regi�o metropolitana.� (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2001:301).

Esta - � preciso deixar bem claro - expuls�o generalizada dos pobres para a periferia, configurou o territ�rio das metr�poles brasileiras e gerou uma gama de� pesquisas sobre segrega��o espacial. O que a prefeitura sob governo petista vai fazer parcialmente � tentar frear este tradicional processo, na forma de urbaniza��o de favelas no mesmo local onde elas estavam situadas, ainda que encravadas no centro da cidade (e com a classe m�dia em volta). Ao mesmo tempo, uma pol�tica de regulariza��o fundi�ria tentava garantir, em �reas de ocupa��o consolidadas, a perman�ncia dos moradores no local onde se encontram. Isto � importante porque reconhece e incorpora estas habita��es (ainda que prec�rias) � cidade formal, tornando mais dif�cil o processo de expuls�o para a periferia.

Existem duas urbaniza��es de favelas bastante emblem�ticas, n�o s� deste programa de pol�tica habitacional, mas da pr�pria disputa pelo espa�o da cidade: a da Vila Planet�rio e da Vila Lupic�nio Rodrigues. Ambos, assentamentos irregulares incrustrados em zonas centrais e bastante valorizadas de Porto Alegre (o que significa, entre outras coisas, estarem localizadas no meio de bairros de classe m�dia). O fato de o governo ter n�o s� respaldo eleitoral como tamb�m do processo do Or�amento Participativo n�o significou falta de contesta��o sobre a regulariza��o e urbaniza��o das duas vilas no local onde se encontravam. A Vila Planet�rio - primeira experi�ncia deste tipo na cidade - al�m de �abaixo-assinados� da popula��o das redondezas sofreu a contesta��o de vereadores com o argumento que o Plano Diretor vigente na �poca (o de 1979, anterior ao Plano proposto pelo PT e atualmente vigente) considerava a �rea como pra�a p�blica (�rea verde) e, portanto, impossibilitaria a perman�ncia da popula��o ali. Na Vila Lupic�nio aconteceu algo semelhante, ainda que muitos anos depois. A favela, no meio do bairro de classe m�dia Menino Deus, sempre foi considerada por uma grande parcela da popula��o do entorno como um �problema� (era comum ap�s roubos e furtos nas imedia��es o ladr�o usar o local como rota de fuga e/ou esconderijo). O resultado foi que, depois de aprovado pelo OP e na imin�ncia do in�cio das obras, circulou pelo bairro (apoiado pela associa��o dos moradores � de classe m�dia) um abaixo-assinado pedindo a remo��o e n�o a urbaniza��o da vila. A peti��o at� tentava ser �politicamente correta�, reconhecendo e apoiando o direito da comunidade a uma habita��o condigna, desde que� isto n�o acontecesse ali, t�o perto da assustada classe m�dia.

Estes dois exemplos servem para demonstrar que a) ainda que n�o se concorde totalmente com as teses de Fl�vio Villa�a (1998), existe sim um componente de disputa por localiza��es na estrutura��o do espa�o urbano (ou intra-urbano, como quer o autor) e b) � poss�vel uma pol�tica que reverta, pelo menos parcialmente, a periferiza��o da pobreza. E o caso do Menino Deus � emblem�tico tamb�m por outro motivo: o bairro vem passando por um processo de verticaliza��o e altera��o no p�blico-alvo dos lan�amentos imobili�rios, de classe m�dia �m�dia� e baixa para classe m�dia-alta (e a urbaniza��o da favela n�o alterou este perfil em transforma��o).

Ao longo dos governos petistas, a participa��o das despesas em �Pol�ticas sociais� no total de gastos da prefeitura aumentou de 39,4 por cento para 54,8 por cento (Prefeitura Municipal de Porto Alegre, 2003).

Na verdade, os maiores respons�veis pelo aumento na participa��o dos gastos em �Pol�ticas Sociais� s�o as Secretarias de Educa��o (SMED) e Sa�de (SMS), esta �ltima tamb�m auxiliada pelos repasses do SUS (Sistema �nico de Sa�de) a partir de 1997, quando o processo de municipaliza��o da sa�de em Porto Alegre estava completado.

O forte crescimento das verbas da SMED deve ser debitado n�o s� aos programas como de alfabetiza��o de adultos, mas ao pr�prio crescimento f�sico da rede de ensino (e portanto tamb�m de pessoal: professores, serventes, etc.). A rede municipal de ensino tamb�m contempla as creches, tanto as constru�das pela pr�pria prefeitura (principalmente atrav�s de demandas do OP) como o dinheiro repassado para creches comunit�rias conveniadas pela Secretaria. Entre 1989 e 2002, o n�mero de estabelecimentos da rede municipal de ensino aumentou de 37 para 91, al�m de terem sido criadas 120 creches comunit�rias. Sem d�vida, foi louv�vel o esfor�o da administra��o municipal em aumentar o n�mero de escolas e de pessoas atendidas pelo sistema.

Outro fator relevante � a localiza��o dos estabelecimentos constru�dos durante o per�odo: a grande maioria em �reas carentes da cidade.

Mas, algo muito importante deve ser considerado: a quantidade maior de equipamentos p�blicos requer tamb�m uma despesa proporcionalmente maior para a manuten��o destes equipamentos. Individualmente, por exemplo, o ensino fundamental representa hoje em dia o maior gasto com pessoal do munic�pio (e o sal�rio pago aos professores � maior do que na rede estadual). Isto � igualmente v�lido para a Sa�de: em 1999 era a segunda maior despesa com pessoal (20,6%), perdendo apenas para o Ensino, com 22,7 por cento (Rabelo, 2003:171).

Como recentemente mencionado, �Sa�de� corresponde a um dos maiores gastos da prefeitura. Em verdade, se forem contabilizadas as transfer�ncias da Uni�o para o SUS, as despesas com com este item se tornam individualmente a maior parcela dos gastos do munic�pio. Para 1999, por exemplo, os recursos do provenientes do governo federal para o SUS representavam 29 por cento da despesa total municipal (Rabelo, 2003:166). Isto coloca outro problema para a an�lise: as melhoras nos �ndices relativos � sa�de em Porto Alegre podem ser imputados unicamente � �boa� gest�o municipal ou tamb�m deve ser levado em considera��o os gastos e as pol�ticas de Sa�de da Uni�o? Um exemplo: entre 1992 e 2001, a mortalidade infantil em Porto Alegre caiu de 18,6� para 14,2�. Mas esta queda n�o foi verificada unicamente na cidade; no estado do Rio Grande do Sul, passou no mesmo per�odo de 19,3� para 15,7�, enquanto no Brasil como um todo foi de 43,0� para 28,3� (dados do IBGE). Ou, em resumo, � no m�nimo complicado atribuir todas as melhorias nos �ndices sociais municipais unicamente � gest�o petista: como sempre � bom relembrar, o local (munic�pio de Porto Alegre) n�o � um microcosmo isolado da influ�ncia de outras escalas (econ�micas, pol�ticas, espaciais).

Pois bem, o que temos at� aqui? O que todos estes n�meros apresentados mostram pelo menos inicialmente?� Que, como apontou Carlos Vainer (citado no in�cio deste artigo), houve investimento na �infraestrutura f�sica e social�. E, um dos respons�veis pela exist�ncia destes investimentos foi o Or�amento Participativo.

Or�amento Participativo: um balan�o

O Or�amento Participativo (OP) parte de uma premissa simples: � um mecanismo pelo qual a popula��o decide onde alocar os investimentos municipais da cidade.

Com mais de quinze anos de funcionamento (continua existindo, ainda que o PT tenha perdido as �ltimas elei��es na cidade), o Or�amento Participativo n�o s� ganhou fama internacional como chamou a aten��o de in�meros pesquisadores. O resultado � que a bibliografia sobre o OP come�a a ficar volumosa [2] e, o que na verdade mais chama a aten��o, � o fato de ser dif�cil encontrar balan�os negativos entre as pesquisas j� realizadas, ainda que pontualmente possam ser encontrados reparos e sugest�es para a melhoria do processo. Cr�ticas mais contundentes s� s�o encontradas em pol�ticos de oposi��o ao Partido dos Trabalhadores e mesmo assim h� um certo temor dos pol�ticos locais em criticar abertamente esta experi�ncia; usualmente, preferem censurar o �esvaziamento� do poder legislativo e propor uma maior participa��o da C�mara de Vereadores no processo.

Uma das coisas mais propagandeadas pelo Partido dos Trabalhadores a respeito do OP foi a exist�ncia de uma invers�o de prioridades na aloca��o de recursos da Prefeitura. A pergunta a ser feita, portanto, �: existiu um efeito redistributivo (em dire��o aos lugares mais carentes) trazido pela din�mica do OP? A resposta inicial � sim.

H� uma correla��o bastante vis�vel entre as regi�es do Or�amento Participativo com renda m�dia menor e o volume de investimentos per capita. Assim, entre 1996 e 2002 a Regi�o Extremo Sul foi a que mais recebeu investimentos, na ordem de R$ 728,17 per capita, seguida por Nordeste (R$ 562,91), Cristal (R$ 371,56), Gl�ria (R$ 369,73) e Lomba do Pinheiro (R$318,44). No outro extremo, est�o Partenon (R$ 130,57), Noroeste (R$ 61,60) e Centro com R$ 42,82 per capita (Tartaruga, 2003:70).

Uma outra forma de verificar o efeito redistributivo do OP foi feito por Marquetti (2002). Este autor mapeou o n�mero de obras por grupo de mil habitantes nas Regi�es e comparou com a renda per capita no per�odo de 1989 a 2000. O resultado foi praticamente o mesmo obtido por Iv�n Tartaruga. A Regi�o Nordeste, a de menor renda, obteve a melhor coloca��o em rela��o ao n�mero de obras executadas por mil habitantes, enquanto a Regi�o Centro, de maior renda, teve a menor rela��o obras/mil habitantes. Tentando mostrar que outros indicadores (al�m da renda) tamb�m demonstram o efeito redistributivo, ele cruzou os dados relativos aos investimentos nas Regi�es com a porcentagem de m�es com primeiro grau incompleto com filhos nascidos vivos, porcentagem de de domic�lios em n�cleos e vilas irregulares e porcentagem de habitantes com menos de 15 anos. Como j� esperado, de forma geral quanto maiores estas porcentagens, maior o investimento realizado atrav�s do mecanismo do Or�amento Participativo.

Para finalizar esta se��o, algumas considera��es se fazem necess�rias. Em primeiro lugar, n�o h� como deixar de observar que o Or�amento Participativo foi se tornando um processo complexo e, ao mesmo tempo, se burocratizando. Toda uma grande estrutura foi sendo montada (e aperfei�oada tamb�m, diga-se de passagem) ao longo dos anos de funcionamento do OP. Esta estrutura faz com que todos possam participar efetivamente no in�cio do processo, mas no final das contas quem realmente vai decidir onde e de que maneira os recursos ser�o aplicados � a minoria eleita para o Conselho do Or�amento Participativo (COP). Al�m do mais, o processo sem d�vida nenhuma � amplamente comandado (ou pelo menos induzido) pela a��o governamental, encarregada de propagandear e fomentar a participa��o nas reuni�es al�m de garantir recursos t�cnicos e espa�o f�sico para a montagem das mesmas.

Refor�ando a presen�a da Administra��o Municipal no processo, n�o se pode esquecer que tamb�m h� uma grande diferen�a entre o saber dos t�cnicos da Prefeitura e os participantes do OP, por mais tempo que estes �ltimos estejam no processo. Isto acarreta, entre outras coisas, que o poder de decis�o muitas vezes pende para o lado do governo, que acaba �impondo� determinadas obras. Segundo o pr�prio Regimento Interno, os conselheiros n�o podem ficar mais de dois anos no cargo, enquanto os funcion�rios municipais n�o tem esta limita��o. A consequ�ncia � que

A renova��o das lideran�as tem um lado positivo. Permite envolver e qualificar cada vez mais pessoas. Mas, por outro lado, cria uma dificuldade para a popula��o discutir de igual para igual com o governo. Enquanto novos conselheiros chegam a cada ano, enquanto as comunidades de base t�m dificuldades ainda maiores de entendimento, os representantes, os t�cnicos da prefeitura ficam anos ap�s anos na fun��o. Al�m do conhecimento t�cnico devido a sua forma��o, eles t�m um ac�mulo de experi�ncia, enquanto a popula��o fica privada desse desenvolvimento. Essa defasagem �permite ao governo, entre outras coisas, promover suas pr�prias obras�, nota Felisberto Luisi. S�o as obras institucionais, cuja id�ia n�o vem das comunidades reunidas nos f�runs regionais ou tem�ticos, mas dos �rg�os da prefeitura que as apresentam � vota��o do conselho do OP. � assim que a terceira perimetral, uma via r�pida que vai interligar o norte com o sul de Porto Alegre, est� sendo realizada, enquanto o tema da circula��o e transporte nunca foi priorizado pela popula��o. � assim tamb�m que se est� conduzindo o projeto integrado da entrada da cidade. O COP aceitou o projeto, sabendo das necessidades dessas comunidades particularmente carentes. Mas n�o se trata de uma demanda da popula��o (ONG Solidariedade, 2003:135-6)

Portanto, apesar de �s vezes dar a impress�o, n�o se est� na presen�a de uma �democracia direta�. A forma que assumiu o OP ficaria melhor descrita como uma democracia representativa, aperfei�oada e paralela ao Poder Legislativo. Da mesma forma, n�o se pode falar que efetivamente o OP funcione como uma pura �esfera p�blica n�o-estatal�, como quer Tarso Genro (1999). A independ�ncia dos participantes, se n�o pode ser desprezada, ao mesmo tempo deve ser relativizada. Todo este mecanismo, por conta destas quest�es, tem implicado muitas vezes em rela��es conflituosas entre Estado e sociedade civil (ou, se prefer�vel, entre o poder municipal e as organiza��es comunit�rias da cidade). Isto n�o significa necessariamente um problema; a tens�o entre o OP e a administra��o local � um sinal que o �aparelhamento� pelo Partido dos Trabalhadores (cr�tica usual dos partidos de oposi��o) do processo tamb�m deve ser relativizada, ainda que n�o desprezada.

Mais uma coisa: em que pese as constata��es sobre o ganho de novos militantes nas organiza��es da sociedade civil e mesmo no Partido dos Trabalhadores, uma das caracter�sticas t�picas observadas pelos estudiosos dos movimentos sociais urbanos pode ser facilmente vista no OP (e constatada pela prefeitura desde o in�cio; ver o texto de Augustin F� in Horn, 1994:59): as pr�prias comunidades aumentam ou diminuem sua participa��o de ano para ano, com tend�ncia clara de redu��o ap�s a conquista das reivindica��es mais emergenciais. Em outras palavras, ao contr�rio do que gostaria uma boa parcela da esquerda, a participa��o nesse processo n�o garante um aumento na �consci�ncia de classe� (e muito menos alguma esp�cie de �radicaliza��o�, sonhada por muitos quadros do partido quando ainda se falava simplesmente em �conselhos populares�).

Por fim: existem limites claros nesta experi�ncia, se pensada em termos de uma estrat�gia da esquerda para se contrapor ao neoliberalismo ou mesmo de uma forma de apontar caminhos para uma poss�vel supera��o do capitalismo. Isto porque, na verdade, o que o Or�amento Participativo apresenta � um gerenciamento de recursos n�o muito diferente que um empres�rio honesto faria com o gerenciamento de suas empresas (n�o gastar mais do que a arrecada��o, s� contrair empr�stimos com garantias s�lidas do n�o comprometimento futuro da capacidade de investimentos, fiscaliza��o no cumprimento de contratos com terceiros, etc.)

O Or�amento Participativo, sem querer tirar seus pr�prios e ineg�veis m�ritos, deu certo porque nunca foi uma amea�a �s institui��es capitalistas. � uma pol�tica inclusiva, porque redistribui recursos territorial e socialmente, levando equipamentos p�blicos urbanos em lugares onde antes isto n�o havia. Mas, o que normalmente n�o se pergunta quando se fala em exclus�o/inclus�o �: inclus�o em que? Em primeiro lugar, � uma pol�tica inclusiva s� nesse sentido, de dar acesso a equipamentos p�blicos para a parcela da popula��o �exclu�da� deles. Portanto n�o h� nada de anti-neoliberalismo ou anti-capitalismo nisso.

Em segundo lugar, �exclus�o social� ou �exclus�o espacial� s�o falsos conceitos. Uma popula��o favelada, por exemplo, mesmo que em prec�rias condi��es, trabalha e se move dentro da cidade e n�o s� no seu local de moradia. O capitalismo n�o � exclusivo, esta n�o � sua l�gica de funcionamento. Na verdade, apenas a forma como se inclui os mais pobres na sociedade brasileira � diferente das classes mais abastadas, porque tem um forte componente de informalidade (em rela��o �s leis trabalhistas e ao ordenamento territorial dos Plano Diretores, por exemplo). Logo, o que o OP tem feito � trazer para a formalidade (ou legalidade) partes do territ�rio da cidade que antes estavam em situa��o prec�ria neste sentido. Em outras palavras, ainda que se queira continuar trabalhando com os conceitos de inclus�o/exclus�o, s� se pode entender pol�ticas de inclus�o como pol�ticas que procuram trazer para dentro da formalidade capitalista pessoas que se encontram parcialmente fora dessa formalidade. N�o mais que isso. Voltarei a este assunto.

Os limites da esquerda no poder local

A partir de tudo que foi discutido at� aqui, uma quest�o pode ser levantada: s�o estas as pol�ticas que caracterizam uma administra��o de esquerda? Porque em verdade quase todas estas pol�ticas mencionadas podem ser encontradas em administra��es de outros Partidos nos mais variados pontos do Pa�s. Alguns exemplos: urbaniza��o de favelas? Projeto Cingapura durante os governos Maluf e Pitta em S�o Paulo. Melhoria nas condi��es de sa�de, queda das taxas de mortalidade e constru��o de novos postos de sa�de em zonas pr�ximas �s �reas carentes? Governo �ngela Amim (PP) em Florian�polis. Aumento de 8 para 40 escolas municipais? Governo D�rio Berger (PSDB) em S�o Jos� (SC). E, diga-se de passagem, exemplos nos mais variados cantos do pa�s n�o faltariam.

Portanto, o que poderia diferenciar uma administra��o petista de outros partidos? Um discurso com pitadas esquerdistas? Talvez o conjunto de a��es, supondo que os outros partidos atendam apenas parcialmente �s necessidades dos mais pobres? N�o se pode esquecer que nenhuma agremia��o pol�tica consegue se manter no governo se n�o atender minimamente interesses das classes dominadas. Porisso a tradicional pulveriza��o de obras pelas periferias das cidades brasileiras feita por praticamente todos os prefeitos: um asfalto aqui, um posto de sa�de acol�, uma obra de conten��o de deslizamentos em morros, etc, etc. � o tradicional clientelismo da pol�tica brasileira: a troca de obras por votos.

Ent�o, seria o fato de as rela��es do PT com a sociedade serem menos clientelistas? Este � um terreno pantanoso, pois os opositores do partido tamb�m sempre acusaram a prefeitura de Porto Alegre de praticar um clientelismo �modificado� via processo do Or�amento Participativo. Em �poca de elei��es as bandeiras e faixas de candidatos do PT s�o absolutamente hegem�nicos nas casas de antigas favelas urbanizadas, por exemplo (por outro lado, por que n�o poderiam ser?).

O caso do Or�amento Participativo � interessante, tanto por sua potencialidade quanto por seus pr�prios limites. Como disse Francisco de Oliveira (2001:19), ele �politiza o poder local� via algo (o or�amento, evidentemente) que sempre foi visto como uma quest�o t�cnica, somat�rio de despesas e receitas. Al�m disso, tem um potencial desformalizador, por dissolver a legitimidade da representa��o pol�tica tradicional e que, n�o � toa, recebeu acirrada oposi��o dos pol�ticos tradicionais da cidade (para n�o falar no quase sil�ncio da m�dia local). Mas o OP nunca foi capaz (pelo menos at� agora) de se transformar num poder efetivamente aut�nomo, como foi comentado neste trabalho. Seja pelo fato de que a grande maioria dos participantes depois de ver atendida sua reivindica��o se retira do processo ou mesmo por muitas vezes haver uma quase imposi��o (praticamente atropelando a �democracia participativa�) de obras priorit�rias pela prefeitura. Os dois casos mais emblem�ticos desta pr�tica talvez sejam a constru��o da 3� Perimetral e o projeto de urbaniza��o de favela �Entrada da Cidade�.

Tamb�m emblem�ticos porque s�o projetos que n�o poderiam ser realizados com dinheiro unicamente vindo das receitas da prefeitura. A Terceira Perimetral, or�ada inicialmente em R$ 113.000.000,00 contou com recursos do BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), enquanto o �Entrada da Cidade� � ainda em andamento e que realizar�, entre v�rias obras, o reassentamento de 3.061 fam�lias � foi or�ado em Us$ 55.000.000,00 com Us$ 27.500.000,00 do FONPLATA (Fundo Financeiro para o Desenvolvimento da Bacia do Prata).

Significativamente, a possibilidade de haver empr�stimos de institui��es internacionais diretamente para projetos de administra��es locais est� relacionado com a �mudan�a do paradigma de desenvolvimento� (ver Zanetta, 2001) acontecido nestas institui��es. Em conson�ncia com as id�ias correntes de globaliza��o (e de uma articula��o mais direta entre global e local), as administra��es locais agora s�o vistas como capazes de �aliviar a pobreza� muito mais eficazmente do que a antiga forma de distribui��o de recursos para grandes projetos nacionais de desenvolvimento. As cidades, na vis�o do Banco Mundial por exemplo, devem buscar a sustentabilidade, boas condi��es de vida para os cidad�os e ao mesmo tempo serem competitivas e fiscalmente respons�veis (ver World Bank, 2000). Porto Alegre tem sido capaz de captar recursos externos porque aos olhos destas institui��es, os itens elencados acima podem ser encontrados na cidade. Imposs�vel n�o colocar aqui uma quest�o provocativa: seriam as administra��es petistas em Porto Alegre uma vers�o, com vi�s de esquerda, do neoliberalismo realmente existente?

Al�m disso, o PT n�o escapou das amarras do processo eleitoral: aos poucos entrou no discurso que o partido governa para toda a cidade e n�o s� para os �trabalhadores� ou �exclu�dos�. Todo per�odo eleitoral se transformava num esfor�o da administra��o em provar isto. E as duas grandes obras citadas entram sem d�vida neste esfor�o. N�o est� aqui em discuss�o a necessidade de uma obra vi�ria estruturadora como a 3� Perimetral, nem mesmo o car�ter potencialmente humanizador de resgatar mais de 3.000 fam�lias para a cidade formal como no projeto �Entrada da Cidade�. Mas uma obra vi�ria de grande porte serviu tamb�m para atender os anseios da classe m�dia em �desafogar o tr�nsito� e a localiza��o do conjunto de favelas atendidas pelo projeto �Entrada da Cidade� � como o pr�prio nome j� deixa antever � tem tamb�m o prop�sito de tirar a �m� impress�o� de quem entra na cidade por sua principal via de acesso rodovi�rio. E, lembro novamente, estas obras passaram pelo OP quase como uma imposi��o da Prefeitura. Os pr�prios moradores das vilas atualmente na fase inicial de obras de reurbaniza��o n�o tinham organiza��o suficiente para demandar o reassentamento atrav�s de todo o processo do OP.

Tendo em vista tudo que foi visto neste trabalho, � poss�vel tirar um modelo de cidade e gest�o, um �modo petista de governar� pela experi�ncia de Porto Alegre? Sim, e este �modelo� pode ser descrito da seguinte forma:

Em primeiro lugar, ao longo dos anos (e das gest�es) o partido foi se acomodando, no sentido de passar do confronto para uma tentativa de consenso sobre a cidade. N�o s� coisas como a interven��o nas empresas de �nibus foram deixadas de lado (que aconteceu logo no in�cio do primeiro mandato petista: havia a inten��o � n�o cumprida � de estatizar o sistema de transporte urbano); o pr�prio Or�amento Participativo � potencialmente desformalizador, como recentemente comentado � foi sendo aceito, quase se institucionalizando e entrando para o �calend�rio da cidade�.

Como ressalva, deve ser dito que este consenso intenta ser atingido atrav�s da a��o pol�tica, pois se reconhece que h� v�rios conflitos e contradi��es em torno do uso da cidade. Portanto, estes conflitos podem ser �acomodados� atrav�s do Estado, que assume o papel de articulador e promotor do bem-estar coletivo. Nesta vis�o, os conflitos podem ser resolvidos �democraticamente� atrav�s de mecanismos participat�rios como o pr�prio OP ou mesmo atrav�s do Sistema Municipal de Gest�o do Planejamento, incentivados pelo Estado.

O problema deste modelo � que ele n�o se prop�e a resolver ou mesmo questionar (j� que n�o se pode esperar superar o capitalismo localmente) as contradi��es sociais. Quando se promove a miscigena��o de usos do solo da cidade, como no caso do Plano Diretor, ou quando se promove a discuss�o do or�amento entre todos os segmentos da cidade, o que est� sendo buscado � uma esp�cie de �desenvolvimento harm�nico� da cidade. Em outras palavras, a utopia petista parece ser n�o a supera��o das condi��es que propiciaram as extremas desigualdades s�cio-espaciais encontradas no pa�s, mas a simples diminui��o destas desigualdades atrav�s da promo��o de um conv�vio �democr�tico� entre todos os segmentos da cidade.

Neste sentido, o �modelo� de cidade aventado n�o � uma contraposi��o ao neoliberalismo ou ao capitalismo. � social-democr�tico, na acep��o cl�ssica do termo (n�o a do PSDB brasileiro), pois procura promover reformas na cidade capitalista com o intuito de melhorar as condi��es de vida das classes menos favorecidas.

E, se formos olhar de um ponto de vista mais amplo, uma quest�o bastante importante pode ser observada a partir da compara��o da distribui��o territorial da renda na cidade de Porto Alegre durante a d�cada de 90. Os dados dos censos demogr�ficos do IBGE de 1991 e 2000 mostram que a cidade seguiu com o modelo cl�ssico de periferiza��o da pobreza. Visto por este �ngulo, n�o houve altera��o no espa�o da cidade durante os governos petistas. Os pobres e os ricos continuaram exatamente no mesmo lugar. E isto depois de mais de uma d�cada de �invers�o de prioridades� como pol�tica da Prefeitura Municipal (mapas da distribui��o territorial da renda na cidade pode ser visto em Lahorgue, 2004:132-135).

N�o existe nenhum mist�rio na explica��o para isto. Na verdade, o tipo de pol�tica desenvolvida pelo PT na prefeitura nunca foi no sentido de alterar a forma de estrutura��o do espa�o urbano, mas de levar equipamentos p�blicos para os extratos exclu�dos destes equipamentos e �trazer� (ou reconhecer oficialmente) para a cidade formal esta mesma popula��o.

A l�gica de configura��o do espa�o urbano continua praticamente a mesma, independente das pol�ticas desenvolvidas no munic�pio. E, sempre � bom ressaltar, a l�gica de forma��o do espa�o urbano passa por outras escalas, al�m da local. A �disputa por localiza��es� no espa�o intra-urbano n�o pode servir como explica��o �nica para a configura��o do ambiente constru�do. Como exemplo bastante �bvio, deve-se lembrar que o aumento do desemprego e suas consequ�ncias sobre a pobreza urbana e a persist�ncia da exist�ncia de um grande n�mero de subabita��es na cidade de Porto Alegre passa por uma escala completamente diferente da local, pois envolve pol�ticas nacionais e regionais de desenvolvimento econ�mico (ou a falta delas) e a maneira de inser��o do Brasil na �globaliza��o�.

Ali�s, voltando � provoca��o do neoliberalismo petista, o PT tamb�m faz �city marketing�.

Mesmo n�o sendo a �mercadotecnia� do qual falavam Borja e Castells, a promo��o internacional da �cidade com qualidade de vida�, da democracia participativa e da �transpar�ncia administrativa� servia ao prop�sito de criar um ambiente prop�cio aos neg�cios, desde que �politicamente corretos� e �sustent�veis�. Para investir em Porto Alegre, � apenas necess�rio que a empresa entre na recente moda da �responsabilidade social�. Isto � t�o verdadeiro que a cidade tem aparecido nos primeiros lugares de todos os rankings sobre �os melhores lugares para se investir� no Brasil promovidos por revistas como Exame. Rigorosamente, nem o Forum Social Mundial escapa disso. Inicialmente visto com certa desconfian�a, logo os empres�rios do setor hoteleiro e do com�rcio come�aram a apreciar o aumento nas ocupa��es (na verdade, lota��o completa) e nas vendas. Nenhum evento, em toda a hist�ria da cidade, foi capaz de movimentar a economia como o Forum faz. Com a prov�vel excess�o dos donos de franquias McDonalds e dos representantes da empresa multinacional Monsanto no Rio Grande do Sul (frequentes alvos de protesto de movimentos ditos �anti-globaliza��o�), todo mundo lamentou o fato de uma das edi��es do Forum ter se mudado para a �ndia em 2004.

Isto tudo pode acontecer porque ao contr�rio do que muita gente tem dito, a l�gica de funcionamento do capitalismo � muito mais de inclus�o do que de exclus�o. Relembrando: ao mesmo tempo que se reproduz, o capitalismo modifica-se (Lefebvre, 1973); como as rela��es mercantis s�o amplamente dominantes, a tend�ncia � de incorpora��o de movimentos potencialmente contestat�rios, como a pr�pria �exporta��o� do OP a centenas de cidades do Brasil e do mundo comprova. O mote �tudo � mercadoria� serve para explanar as raz�es tendenciais da inclus�o, muito mais poderosas que de exclus�o. Como nunca � demais lembrar, o processo de acumula��o de capital � ao mesmo tempo um processo de expans�o tanto hist�rico quanto geogr�fico, de incorpora��o de novos territ�rios � logica da mercadoria, como provam no in�cio a dissolu��o das amarras e fronteiras feudais e forma��o dos estados nacionais, e posteriormente a expans�o das corpora��es multinacionais para al�m das fronteiras nacionais no s�culo XX. Em outras palavras, o capitalismo � tendencialmente inclusivo. Mas este � um processo contradit�rio, que �exclui� parcelas da popula��o do mercado em v�rios momentos e espa�os diferentes, como o pr�prio Marx j� alertava ao falar da cria��o do ex�rcito industrial de reserva (Marx, 1985).

Portanto, todas as pol�ticas (al�m de manifesta��es e protestos como o �grito dos exclu�dos�) que se prop�e a resolver o problema da habita��o com a constru��o de moradias, de distribuir terra, da cria��o de emprego e gera��o de renda fazem, em �ltima inst�ncia, o papel de tentar reinserir no mercado os �marginalizados�. Como bem disse Jos� de Souza Martins (2002:38), �a contradi��o de que o exclu�do � produto e express�o n�o � contradi��o constitutiva, (�) porque ela se resolve na reprodu��o ampliada e n�o na transforma��o da sociedade que o vitima�.

Esta � mais uma raz�o para este trabalho afirmar que as pol�ticas sociais implementadas pela prefeitura durante os mandatos petistas s�o programas inclusivos, que a caracter�stica das administra��es ao longo destes mais de 15 anos � social-democrata e pouco questiona a l�gica capitalista.

Mas, nunca � demais insistir, este texto n�o advoga a tese que �quanto pior melhor� ou que �n�o h� alternativa�. O que se procurou demonstrar � que:

 existem limites na administra��o de uma cidade capitalista dados pelo pr�prio sistema; a l�gica de acumula��o n�o est� limitada ao espa�o restrito de uma cidade e, portanto, da mesma maneira que o �socialismo em um s� pa�s� � altamente question�vel, n�o � poss�vel o �socialismo em uma s� cidade�;

esta l�gica � multiescalar: fatores regionais, nacionais e mundiais contribu�ram para a produ��o do espa�o urbano na capital ga�cha; portanto, n�o � poss�vel aceitar a ideologia simplista da escala dual �global e local�. Da mesma maneira, somente atrav�s do local n�o � poss�vel haver contraposi��o ao neoliberalismo;

 o pr�prio car�ter contradit�rio do capitalismo oferece a possibilidade da exist�ncia de movimentos e pol�ticas que questionem a predomin�ncia do valor de troca nas rela��es sociais;

mesmo que existam limites estruturais na administra��o de uma cidade capitalista por um partido de esquerda, n�o se pode esquecer que assim como o locus privilegiado da re-produ��o capitalista � o espa�o urbano, da mesma maneira o locus privilegiado da contradi��o e da possibilidade de contesta��o tamb�m � o espa�o urbano (e, n�o pode ser esquecido, o espa�o urbano de Porto Alegre n�o � s� o territ�rio do munic�pio);

 as pol�ticas implementadas pelo Partido dos Trabalhadores em Porto Alegre n�o foram pol�ticas questionadoras ou que procurassem for�ar os limites capitalistas;

o Or�amento Participativo, excess�o destas pol�ticas por questionar e confrontar estruturas tradicionais de poder na cidade, acabou �preso� nos limites da discuss�o sobre a distribui��o dos recursos or�ament�rios, ainda mais se for considerado que por maior que seja a cidade, o volume de recursos de uma administra��o municipal � sempre limitado.


Finalmente, deve ser dito que n�o foi objetivo deste trabalho discutir ou propor alternativas, mas mostrar que os limites da experi�ncia de Porto Alegre coloca a todos � militantes ou simpatizantes da esquerda � a necessidade de se repensar e discutir os objetivos e estrat�gias da esquerda, em todas as escalas.

2 Sem pretender mencionar todas os trabalhos j� desenvolvidos sobre o assunto, um balan�o positivo pode ser visto em Abers (1998 e 2000), Fedozzi (1997), Genro (1997), Horn (1994), Moura (1997), Santos (2002), Souza (2000 e 2002), Tartaruga (2003).

ABERS, Rebbeca. Inventando a democracia: distribuição de recursos públicos através da participação popular em Porto Alegre, RS. [on line], 1998. <//www.portoweb.com.br/ong/cidade> [14 de fevereiro de 2002].

BORJA, Jordi e CASTELLS, Manuel. As Cidades como Atores Políticos. Novos Estudos CEBRAP, 1996, nº 45, p. 152-166.

BORJA, Jordi e FORN, Manuel. Políticas da Europa e dos Estados para as cidades. Espaço e Debates, 1996, nº 39, p. 32-47.

BRESSER-PEREIRA, Luis Carlos. O paradoxo da esquerda no Brasil. Novos Estudos CEBRAP, 2006. nº 74, p. 25-45.

FEDOZZI, Luciano. Orçamento Participativo: reflexões sobre a experiência de Porto Alegre, Porto Alegre: Tomo, 1997.

GENRO, Tarso (coord). Porto da Cidadania. Porto Alegre: Artes e Ofícios, 1997.

GENRO, Tarso. O futuro por armar. Petrópolis: Vozes, 1999.

HARVEY, David. The urban experience. Baltimore: Johns Hopkins, 1989.

HORN, Carlos H. (org). Porto Alegre: o desafio da mudança. Porto Alegre: Ortiz, 1994.

LAHORGUE, Mario L.: Espaço e políticas urbanas: Porto Alegre sob governo do Partido dos Trabalhadores. Tese de Doutorado, Geografia, UFSC: 2004.

LEFEBVRE, Henri. Espacio y politica. Barcelona; Peninsula, 1976.

LEFEBVRE, Henri. El derecho a la ciudad. Barcelona: Peninsula, 1978.

MARQUETTI, Adalmir. O Orçamento Participativo como uma política redistributiva em Porto Alegre. Porto Alegre: 1º Encontro de Economia Gaúcha, 16 e 17 de maio, 2002.

MARTINS, José de Souza. A sociedade vista do abismo: novos estudos sobre exclusão, pobreza e classes sociais. Petrópolis: Vozes, 2002.

MARX, Karl. O Capital: crítica da economia política. 3 vol. São Paulo: Nova Cultural, 1985.

MOURA, Maria S. S. Cidades empreendedoras, cidades democráticas e redes públicas: tendências à renovação na gestão local. Tese de Doutorado, Administração, UFBA, 1997.

OLIVEIRA, Francisco de. Aproximações ao enigma: o que quer dizer desenvolvimento local? São Paulo: Pólis; Programa gestão pública e cidadania/EAESP/FGV, 2001

ONG SOLIDARIEDADE. Caminhando para um mundo novo: Orçamento Participativo de Porto Alegre visto pela comunidade. Petrópolis: Vozes, 2003.

PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE. Relatório de Indicadores sociais de Porto Alegre - ano III � 2000. Porto Alegre: PMPA, 2001.

PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE. Relatório de Indicadores sociais de Porto Alegre - ano V � 2002. Porto Alegre: PMPA, 2003.

RABELO, Mercedes. O desempenho das finanças e o perfil dos gastos sociais em Porto Alegre, nos anos 90. Indicadores econômicos FEE, 2003, vol. 31, nº 2, p. 149-176.

SANTOS, Boaventura de Souza (org). Democratizar a democracia: os caminhos da democracia participativa. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2002.

SOUZA, Marcelo L. Os Orçamentos Participativos e sua Espacialidade: uma agenda de pesquisa. Terra Livre, 2000, nº 15, p. 39-58.

SOUZA, Marcelo L. Mudar a cidade: uma introdução crítica ao planejamento e à gestão urbanos. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2002.

TARTARUGA, Iván G. P. O Orçamento Participativo de Porto Alegre: o lugar e o território do cidadão. Dissertação de mestrado, Geografia: UFRGS, 2003.

VAINER, Carlos B. As escalas do poder e o poder das escalas: o que pode o poder local?. Cadernos IPPUR, 2002. nº 2001-2/2002-1, p.13-32.

VILLAÇA, Flávio. Espaço intra-urbano no Brasil. São Paulo: Studio Nobel, 1998.

WORLD BANK. Cities in transition: a strategic view of urban and local government issues. Washington: World Bank, 2000.

ZANETTA, Cecilia. The evolution of the World Bank's urban lending in Latin America: from sites and services to municipal reform and beyond. Habitat International, 2001, nº 25, p. 513-533.

LAHORGUE, Mario Leal.  A esquerda no poder local: Porto Alegre e o Partido dos Trabalhadores.  Scripta Nova. Revista Electrónica de Geografía y Ciencias Sociales.   Barcelona: Universidad de Barcelona, 1 de agosto de 2007, vol. XI, núm. 245 (16). <//www.ub.es/geocrit/sn/sn-24516.htm> [ISSN: 1138-9788]

Toplist

Última postagem

Tag