A umbanda é uma religião brasileira que sintetiza vários elementos das religiões africanas, indígenas e cristãs, porém sem ser definida por eles.[1] Formada no início do século XX no sudeste do Brasil, na cidade de São Gonçalo, região metropolitana do Rio de Janeiro, a partir da síntese com movimentos religiosos como o candomblé, o catolicismo e o espiritismo. É considerada uma "religião brasileira por excelência" com um sincretismo que combina o catolicismo, a tradição dos orixás africanos e os espíritos de origem indígena.[2][3] Show
O dia 15 de novembro é considerado pelos adeptos como a data do surgimento da umbanda,[4][5] e foi oficializado no Brasil em 18 de maio de 2012 pela Lei 12.644.[6] Em 8 de novembro de 2016, após estudos do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH), a umbanda foi incluída na lista de patrimônios imateriais do Rio de Janeiro por meio de decreto.[7] Etimologia[editar | editar código-fonte]"Umbanda" ou "embanda"[8] são oriundos da língua quimbunda de Angola, significando "magia",[3] "arte de curar".[9] Há também a suposição de uma origem em um mantra na língua adâmica cujo significado seria "conjunto das leis divinas"[10] ou "deus ao nosso lado".[5] Também era conhecida a palavra "mbanda" significando “a arte de curar” ou “o culto pelo qual o sacerdote curava”, sendo que "mbanda" quer dizer “o Além, onde moram os espíritos”.[11] Após o Congresso de 1941,[12] declarou-se que "umbanda" vinha das palavras do sânscrito aum e bhanda, termos que foram traduzidos como "o limite no ilimitado", "Princípio divino, luz radiante, a fonte da vida eterna, evolução constante".[13] História[editar | editar código-fonte]Século XVII - Calundu dos escravizados[editar | editar código-fonte]As primeiras comunidades religiosas afro-brasileiras que se tem documentadas surgiram ainda no século XVII, mais especificamente o ano de 1685.[14] Praticadas pelos escravos, essas comunidades religiosas e suas práticas de culto ficaram conhecidas como Calundu.[15] Os calundus surgiram a partir das chamadas rodas de batuques, onde os escravos dançavam, tocavam atabaques em seus momentos de folga ao redor das senzalas.[15] Eram ostensivamente perseguidos pelas autoridades civis e colonizadores portugueses.[14] Existia no calundu o sincretismo entre as crenças africanas, com Pajelança indígena e Catolicismo.[15] O calundu vai se dividir em duas vertentes importantes: a cabula e o candomblé angola.[16] A cabula sincretizava as crenças africanas do Calundu com o catolicismo, pajelança indígena — sincretismo já existente no calundu — e espiritismo kardecista.[14] Com o crescimento do número de escravos vindos de diversos lugares, o calundu passa a ser cultuado de forma mais elaborada, dando início ao candomblé, que manteve o ritualismo banto sincretizado com catolicismo.[16][17] Com a chegada dos povos iorubás, quetos, oiós, ijexá, ijebu odé, ibadan, egbás e jejes que desejavam preservar com mais intensidade os elementos ritualísticos africanos de seus territórios de origem, — mas sem deixarem de utilizar o sincretismo católico como forma de se livrarem das perseguições feitas pelos colonizadores e as elites dominantes, — surgem as demais linhas do candomblé, como o candomblé-queto e o candomblé-Jeje.[18] Com o tempo, os templos de cabula e banto que não aderiram aos sincretismos e as influências jejê-nagô existentes na sua versão fluminense, passam a dar origem aos terreiros de Umbanda Angola e Almas e Umbanda Omolokô.[14] Século XVII a XIX - A Cabula[editar | editar código-fonte]Muitos estudiosos remontam as origens da umbanda, de forma prática, nos rituais dos antigos centros de cabula, conhecidos popularmente como macumba já existentes desde o século XVIII.[19] Populares no Rio de Janeiro, Minas Gerais, Espírito Santo, São Paulo e Bahia, os terreiros de Cabula, tal como a Umbanda, sincretizava rituais africanos com Catolicismo, Espiritismo Kardecista e crenças indígenas.[20] Zélio Fernandino de Morais adaptou os rituais da Macumba sob uma roupagem espírita kardecista.[19] Posteriormente, a cabula foi absorvida pela umbanda. Os terreiros de Umbanda das zonas rurais e periferias de zonas urbanas, conhecidas como umbanda Popular, descendem de tais terreiros de cabula.[20] Alguns ritos umbandistas como omolokô, Almas e Angola também surgiram a partir dos terreiros de cabula apesar de terem uma influência mais forte do candomblé.[20] A cabula se dividiu em dois grupos principais: Cabula bantu[editar | editar código-fonte]Surgiu no século XIX, em Minas Gerais e na Bahia e é descendente direta dos calundus praticados pelos escravizados.[21] Se espalhou pelos estados do Rio de Janeiro e Espírito Santo, onde sofreu perseguição das elites cristãs até os das de hoje.[21] A cabula banto sincretizava o calundu, com toda sua raiz africana de origem banto, com elementos do catolicismo, espiritismo e crenças indígenas.[21] Macumba popular[editar | editar código-fonte]Surgiu no final do século XIX, no Rio de Janeiro e se espalhou rapidamente em São Paulo e Espírito Santo.[22][23] Era altamente sincretizada. Era a Cabula, com seu sincretismo de ritualismo africano de origem banto, elementos do catolicismo, crenças indígenas e espiritismo.[23] A diferença é que no Rio de Janeiro a Cabula recebeu influências do ritualismo e práticas jejê-nagô e do esoterismo europeu através de publicações como O Livro de São Cipriano da Capa Preta.[23] Tanto no Rio de Janeiro, como em São Paulo e no Espírito Santo, a macumba agregava em si elementos religiosos dos mais variados tipos e origens como as crenças já populares no Brasil, as luso-brasileiras, as árabes, as francesas, as ciganas, as hebraicas e tantas outras oriundas de várias partes do mundo.[23] A macumba era altamente sincrética ao agregar em si diversas concepções religiosas.[23] A macumba possuía uma grande diversidade ritualística entre os seus terreiros.[23] Por conta de seu sincretismo, era frequentada por parte da elite como também pelas classes menos favorecidas e pessoas de diversas religiões e origens.[24][23] O jornalista João do Rio falará a respeito disso:[25]
A macumba se dividirá em dois grupos principais: um atrelado ao Espiritismo Kardecista, que irá abolir várias práticas consideradas primitivas e selvagens, como o sacrifício de animais e o uso de atabaques e o outro grupo que continuará com o seu curso normal, porém que será relegado à marginalidade pela classe elitista.[15] O primeiro grupo dará origem à Umbanda branca e demanda, de Zélio Fernandino de Moraes e o segundo grupo será conhecido como sendo Umbanda popular.[15] Zélio Fernandino e o anúncio da Umbanda[editar | editar código-fonte]Por volta de 1907[26]/1908 (15 de novembro de 1908)[5] (as fontes divergem quanto à data precisa), um jovem chamado Zélio Fernandino de Morais, prestes a ingressar na Marinha, passou a apresentar comportamento estranho que a família chamou de "ataques". O jovem tinha a postura de um velho dizendo coisas incompreensíveis, em outros momentos se comportava como um felino.[27] Após ter sido examinado por um médico, este aconselhou a família a levá-lo a um padre, mas Zélio foi levado a um centro espírita. Assim, no dia 15 de novembro, Zélio foi convidado a se sentar à mesa da sessão na Federação Espírita de Niterói,[26][5] presidida na época por José de Souza[5] . Incorporou um espírito, se levantou durante a sessão e foi até o jardim para buscar uma flor e colocá-la no centro da mesa, contrariando a regra de não poder abandonar a mesa uma vez iniciada a sessão. Em seguida, Zélio incorporou espíritos que se apresentavam como negros escravizados e índios. O diretor dos trabalhos alertou os espíritos sobre seu atraso espiritual, convidando-os a sair da sessão quando uma força tomou conta de Zélio e disse:[28]
Ao ser indagado por um médium ele respondeu:[28]
A respeito de sua missão, assim anunciou:[30][5]
No dia seguinte, na residência da família de Zélio, na Rua Floriano Peixoto, nº. 30, no bairro Neves, reuniram-se os membros da Federação Espírita, visando comprovar a veracidade do que havia sido declarado[31] pelo jovem. Novamente incorporou o Caboclo das Sete Encruzilhadas, que declarou que os velhos espíritos de negros escravizados e índios de nossa terra poderiam trabalhar em auxílio do seus irmãos encarnados, não importando a cor, raça ou posição social.[5] Assim, neste dia fundou o primeiro terreiro de umbanda chamado de Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade.[26] O espírito estabeleceu normas como a prática de caridade, cuja base se fundamentaria no Evangelho de Cristo e seu nome "allabanda",[32] substituído por "aumbanda", e posteriormente se popularizando como "umbanda".[31] Período intermediário: tentativas de unificação e rupturas na Umbanda[editar | editar código-fonte]Ala antiafricanista: a formação da União Espírita de Umbanda do Brasil[editar | editar código-fonte]No ano de 1918, fundaram-se sete tendas para a propagação da Umbanda: Tenda Espírita Nossa Senhora da Guia, Tenda Espírita Nossa Senhora da Conceição, Tenda Espírita Santa Bárbara, Tenda Espírita São Pedro, Tenda Espírita Oxalá, Tenda Espírita São Jorge e Tenda Espírita São Gerônimo. Até a morte de Zélio em 1975, mais de 10.000 templos foram fundados além destes iniciais.[33] Em 1939 com o objetivo de acabar com polêmicas e na tentativa de uma unificação foi criada a União Espírita de Umbanda do Brasil.[34] A partir desse momento, somente as práticas que seguiam os fundamentos propostos pelo Caboclo Sete Encruzilhadas passaram a ser consideradas como umbandistas.[35] Em 1940, o escritor Woodrow Wilson da Matta e Silva apresentou a Umbanda como ciência e filosofia, criando então a Escola Iniciática da Corrente Astral do Aumbhandan, a "Umbanda Esotérica" na Tenda Umbandista Oriental, em Itacuruçá, no Rio de Janeiro.[36] Em 1941 a UEUB organizou sua primeira conferência, o I Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda[37] como forma de tentar definir e codificar a Umbanda como uma religião em direito próprio e como uma religião que une todas as religiões, raças e nacionalidades. A conferência também promoveu uma dissociação das tradições afro-brasileira.[12] Os participantes concordaram em fazer uso das obras de Allan Kardec como fundação doutrinária da Umbanda, ao mesmo tempo que se dissociavam das outras tradições religiosas afro-brasileiras.[38] Ainda assim, os espíritos fundadores da Umbanda, os Caboclos e os Preto Velhos ainda foram mantidos como espíritos altamente evoluídos. Em termos gerais, os participantes do Congresso se esforçaram em legitimar a Umbanda como uma religião altamente evoluída, por exemplo, afirmando que a Umbanda já existia como uma religião organizada há bilhões de anos,[carece de fontes] estando então à frente de todas as outras religiões. Como parte desses esforços em definir a Umbanda como uma religião original e altamente evoluída, os participantes procuraram remover suas raízes africanas e afro-brasileiras, rastreando a origem da Umbanda até o Oriente,[carece de fontes] de onde supostamente se espalhara para Lemúria[39] e subsequentemente para a África. No continente africano, a Umbanda teria se degenerado em fetichismo,[38] e nessa forma foi trazida ao Brasil pelos escravizados.[40] A influência africana na Umbanda não foi de todo rejeitada. No entanto, a sua importância sofreu devido a percepções de corrupção da tradição religiosa original, como uma fase de retrocesso em sua evolução; a Umbanda foi exposta ao barbarismo na forma de costumes vulgares e praticada por pessoas com "costumes rudes e defeitos psicológicos e étnicos"[41] Outra forma de lidar com o caráter africano da Umbanda foi exposto na compreensão que se originou na África, porém na África Oriental (Egito), sendo então da parte mais "civilizada" do continente.[42] Um dos objetivos da conferência foi então rastrear as raízes "genuínas" da Umbanda até o Oriente; a invenção das raízes orientais juntamente com a rejeição das africanas foi refletida na definição do termo "umbanda", que é de outro modo geralmente acreditado ser derivada do idioma Banto. Declarou-se que "umbanda" vinha das palavras do sânscrito aum e bhanda, termos que foram traduzidos como "o limite no ilimitado", "Princípio divino, luz radiante, a fonte da vida eterna, evolução constante".[13][12]. A partir da década de 1950, os setores mais humildes da população umbandista composta por negros e mulatos começaram a contestar o distanciamento da Umbanda das práticas africanas. A "umbanda branca" se opunha à tendência de recuperar os valores africanos presentes na religiosidade popular.[43] O segundo congresso ocorreu em 1961 evidenciando o crescimento da religião que teve sua imagem reconstruída pela imprensa, milhares de devotos compareceram ao Maracanãzinho com representantes de vários estados e a presença de políticos municipais e estaduais.[43] O jornal O Estado de S. Paulo noticiou a realização do congresso no Rio de Janeiro afirmando que a "preocupação central do Congresso parece ser a elaboração de um código que orientará a feitura de uma Carta Sinódica da Umbanda". No mesmo ano, o jornal Diário de S. Paulo publicou uma grande reportagem com o título "Saravá meu Pai Xangô, Saravá Mamãe Oxum", onde o jornalista descreve uma "sessão assistida pelos repórteres a convite do deputado gaúcho Moab Caldas".[44] Ala pró-africanista: a formação da Federação Umbandista de Cultos Afro-Brasileiros[editar | editar código-fonte]Em 1950, em resposta às perseguições que os terreiros sofriam por parte das autoridades civis bem como em resposta ao projeto de "embranquecimento" da Umbanda pregada pela União Espírita de Umbanda do Brasil, o pai de santo Tancredo da Silva Pinto liderou o movimento que deu origem à Federação Umbandista de Cultos Afro-Brasileiros.[45] A federação visava organizar e dar maior representatividade aos terreiros que sofriam preconceito por conta de seus ritos afro-brasileiros.[46][45] A federação, que nasceu no Rio de Janeiro, promoveu várias ações e eventos religiosos bem como se expandiu para os estados de Minas Gerais, São Paulo, Rio Grande do Sul e Pernambuco.[47] Defensora tenaz das origens africanas da Umbanda em contraposição ao grupo que pregava uma Umbanda com forte ênfase no kardecismo.[47][45] Fracasso das tentativas de unificação e os terreiros independentes[editar | editar código-fonte]Mesmo após as tentativas de unificação, nas décadas de 40, 50 e 60 ainda existiam inúmeros terreiros no Rio de Janeiro não vinculados à União Espírita de Umbanda do Brasil, principalmente por discordarem das normativas propostas pela federação e por serem consideradas atividades isoladas. Também não eram vinculadas à Federação Umbandista de Cultos Afro-Brasileiros. Estes terreiros realizavam práticas ritualistas sob a denominação de Umbanda, por exemplo a Tenda Espírita Fé, Esperança e Caridade e Pai Luiz D'Ângelo, praticante do segmento Umbanda de Almas e Angola.[5] Consolidação perante a opinião pública[editar | editar código-fonte]No terceiro congresso realizado em 1973[48] a Umbanda afirmou-se em definitivo como uma religião expressiva no campo das atividades assistenciais, além dos centros onde ocorriam as atividades espirituais, a religião contava com escolas, creches, ambulatórios etc. articuladas em torno da missão de promover a caridade e a ajuda.[49] Na década de 1980 a Umbanda teve seu auge ao ser declarada como religião de muitas personalidades como os cantores Clara Nunes, Dorival Caymmi, Vinícius de Moraes, Baden Powell, Bezerra da Silva, Raul Seixas, Martinho da Vila entre outros.[50] Na década de 1990 a Umbanda e outras religiões de matrizes africanas foram alvo do crescente neopentecostalismo brasileiro. Em 2003, foi fundada a Faculdade de Teologia Umbandista (FTU), mantida pela Ordem Iniciática do Cruzeiro Divino[51] fundada em 1970 por Francisco Rivas Neto, na Água Funda, São Paulo.[52] Discussões a respeito do início da umbanda[editar | editar código-fonte]Apesar de a Umbanda ter sido anunciada por Zélio Fernandino de Moraes e seu guia espiritual Caboclo Sete Encruzilhadas, não foi a sua vertente que se tornou popular no Brasil.[53] A umbanda se popularizou através de sua raiz africanista encontrada na cabula do Rio de Janeiro, também conhecida como macumba.[54][53] Muitos estudiosos defendem que a raiz da Umbanda precede ao anúncio de Zélio e que o mesmo teria incorporado elementos das religiões afro-brasileiras à um ritual com características espíritas kardecistas.[54] No ritual de Zélio, alguns elementos mais africanizados como o uso de atabaques, a prática do sacrifício animal ritualístico, manifestações de exus e pombajiras e outros mais foram suprimidos.[54] Tal processo foi chamado de "embranquecimento" da umbanda, visto que tal prática tornava a Umbanda mais palatável aos costumes das classes alta e média do Rio.[54] Os terreiros, principalmente os terreiros de Umbanda popular, do ritual Almas e Angola, do omolocô e da Umbanda traçada, praticados por pessoas de classe baixa e situados nas comunidades, nas zonas rurais e favelas continuaram com as práticas africanas mais próximas às práticas da Macumba antiga e, consequentemente, do candomblé.[54] Um dos grandes proponentes ao retorno da Umbanda às suas raízes africanas foi o, já citado, escritor e pai de santo Tancredo da Silva Pinto.[54] Crenças e práticas[editar | editar código-fonte]Pai Zezinho de Ogum, pai de santo do terreiro Tenda Espírita Vovó Maria Conga de Aruanda, a primeira instituição cadastrada no mapa de terreiros de umbanda do Rio de Janeiro Tenda espírita Vovó Maria Conga de Aruanda, no Estácio, que foi a primeira instituição cadastrada no mapa de terreiros de umbanda da cidade do Rio de Janeiro A Umbanda pode ter várias vertentes com práticas diversas, nomeadas de diferentes formas[55] como umbanda tradicional de nação ou Umbanda, umbandomblé, umbanda sagrada umbanda omolocô, umbanda crística, etc.[56][57] Essas diferentes vertentes partilham o culto a entidades ancestrais e a espíritos associados a divindades diversas, que podem pertencer ao Catolicismo, a cultos africanos, hindus, árabes entre outros.[56] Apesar de diferentes vertentes existem alguns conceitos encontrados que são comum a todas, sendo estes: [58][59][60]
Também se fundamentam na obediência aos ensinamentos básicos dos valores humanos, como a fraternidade, a caridade e o respeito ao próximo. Além desses preceitos também estão a necessidade da prática mediúnica como por exemplo servindo de "aparelho" (o medium) para viabilizar a comunicação entre espíritos e Orixás com os seres humanos.[62] A antropóloga brasileira Patrícia Birman falará o seguinte a respeito da diversidade de crença dentro da Umbanda e a unidade doutrinária na diversidade:[63]
Ritos[editar | editar código-fonte]Os rituais da Umbanda visam evocar o Orixá ancestral e toda sua hierarquia composta por Orixás menores, Guias e Protetores.[64] Os rituais não têm forma ou modo definido de modo que variam de casa para casa e estão subordinados às decisões de cada Pai-de-santo e cada entidade protetora do terreiro.[65] O local onde se dá as celebrações e o atendimento do público é geralmente uma casa denominada por tenda que contém um terreiro e um salão apropriado para sessões.[66] Alguns termos e rituais comumente mencionados:
Entidades[editar | editar código-fonte]Os espíritos (entidades) que trabalham na Umbanda são organizados em linhas e falanges (legiões) de uma forma quase militar. Cada linha está sob a direção de uma deidade africana ou orixá, enquanto os nomes e configurações exatas variam dentro da Umbanda, eles são em sua maioria compostos a partir de divisões étnicas, por exemplo, "Povo de Moçambique", "Legião de Tupi-Guarani". Em geral, os espíritos nos rituais da umbanda se enquadram nas seguintes categorias:[82]
Todas os acima são chamados de "espíritos de luz" porque trabalham para o bem, há também os espíritos banidos da umbanda que são ditos trabalharem para o lado obscuro, dentro da quiumbanda, um tipo de oposto negativo da umbanda.[82] Sincretismo[editar | editar código-fonte]Os Orixás, na cultura iorubá, são divindades associadas ao panteão africano. Etimologicamente, em tradução livre, Orixá significa "a divindade que habita a cabeça" (em iorubá, ori é cabeça e Xá é rei, divindade).[83] Os orixás se relacionam com os elementos da natureza sendo interpretados como manifestações da mesma.[83] São considerados como manifestações e qualidades de Deus.[83] Por conta da diversidade que existe na Umbanda, a interpretação sobre o que significam os Orixás variará de linha doutrinária para linha doutrinária, de terreiro para terreiro.[83] É de se atentar que alguns terreiros possuem outros tipos de influência. Os terreiros mais próximos doutrinariamente do Espiritismo Kardecista, não cultuam os orixás ou entidades similares.[45] Alguns terreiros, com influência gêge e angola, podem cultuar os voduns e inquices respectivamente. Pode ocorrer a mescla entre os tipos de divindades dependendo da tradição do terreiro.[45] O número total de entidades pode variar de terreiro para terreiro, de linha doutrinária para linha doutrinária. O sincretismo com os santos católicos passa por grande variação, contudo essa mudança ocorre com mais frequência de região para região. Existem duas grandes vertentes de sincretismo: a da Bahia e a do Rio de Janeiro.[45] A grande maioria dos terreiros de Umbanda seguem os orixás-iorubá de forma semelhante ao candomblé do queto[84] e sincretizam os orixás-iorubá com os santos católicos traçando as qualidades dos orixás e suas semelhanças com os santos.[84]
Devido a grande diversidade existente na Umbanda, existem alguns terreiros com influência dos cultos mina-gegê e congo que seguem os orixás dessas respectivas culturas.[85] Os cultos de mina-gegê, de forma semelhante do Candomblé Jeje, denominam seus orixás de voduns.[85] Os de rito congo, de forma semelhante ao Candomblé Angola, denominam seus orixás de inquices.[85] Variam-se os nomes dependendo da casa.[85] O sincretismo católico segue o mesmo que os orixás iorubá.[85] A nação do congo pratica rituais muito parecidos com os de mina-gegê. Apesar de vários de seus orixás serem denominados de forma diferente, as entidades possuem o mesmo nome em algumas ocasiões.[85]
Hino[editar | editar código-fonte]Originalmente com o título de Refletiu a Luz Divina, tem autoria atribuída a José Manoel Alves. No Segundo Congresso Nacional de Umbanda, em 1961 no Rio de Janeiro, a música foi oficialmente reconhecida como o Hino da Umbanda.[86]
Organização[editar | editar código-fonte]Espaço físico[editar | editar código-fonte]A parte física de um terreiro de umbanda contém seis elementos fundamentais: [87]
Hierarquia[editar | editar código-fonte]Maria da Guia, médium do terreiro Tenda Espírita Vovó Maria Conga de Aruanda A hierarquia na Umbanda pode variar dependendo da quantidade de membros de modo que pode se dividir em um grupo administrativo e grupo espiritual[89][90][91] além de variar de acordo com o tipo de Umbanda (de nação, Esotérica etc). Os templos de Umbanda não possuem uma uniformidade quanto às hierarquias, pois sendo diversificada tanto quanto na ritualística seus títulos e cargos podem ser variados entre si.[92] A linha de nagô é a mais comum, existindo muitas variações dessa.[92] Birman vai dizer o seguinte a respeito da fluidez organizacional da Umbanda:[93]
Contudo, segue abaixo as divisões hierárquica catalogadas, registradas e apresentadas por Tancredo da Silva Filho[94]: Linha de nagô[nota 2][94][editar | editar código-fonte]
Linha de angola[94][editar | editar código-fonte]
Linha de Omolokô[94][editar | editar código-fonte]
Linha de Cambinda[94][editar | editar código-fonte]
Linha de Gêge[94][editar | editar código-fonte]
Linha de Cáritas[editar | editar código-fonte][nota 3][94]
Ramificações[editar | editar código-fonte]A umbanda possui algumas ramificações, caracterizadas por diferenças em rituais, métodos, hierarquia, etc. Mesmo pertencendo a um mesmo grupo, estudiosos concluem que a religião é extremamente diversificada sendo quase impossível encontrar um terreiro totalmente semelhante ao outro. Apesar disso, existem algumas ramificações conhecidas.[96] Originalmente, a Umbanda surgiu a partir da Cabula. Simultaneamente surgiram quatro vertentes: Umbanda popular, Umbanda branca e demanda, Umbanda Almas e Angola e Umbanda Omolokô. Todavia, considera-se a vertente iniciada por Zélio Fernandino de Moraes como sendo a primeira. Entre as vertentes mais conhecidas estão:[97][83]
Mesmo pontuando tais linhas, de acordo com estudiosos da área, cada terreiro possui sua tradição com modalidades demasiadamente diferenciadas entre si, correspondendo assim apenas a uma parcela dos participantes dessa religião.[117] A umbanda é extremamente aberta e diversificada, apesar de ter seus princípios e bases religiosos.[117] Críticas[editar | editar código-fonte]Era Vargas até a década de 1950[editar | editar código-fonte]Assim como outras religiões afro-brasileiras, a umbanda sofreu repressão política durante a era Vargas até o início de 1950. Uma lei de 1934 colocava estas religiões sobre a jurisdição do Departamento de Tóxicos e Mistificações da polícia de modo que era preciso um registro especial para funcionarem. Durante esses anos vários grupos se mantinham na clandestinidade ou, quando se registravam, procuravam omitir suas ligações ou inspirações africanas se registrando como sendo apenas "espiritistas".[118] Essa omissão ou "desafricanização"[119] que rejeitava as influências das religiões africanas foi estabelecida mais claramente no I Congresso Brasileiro de Espiritismo de Umbanda realizado em 1941, que definiu entre outros aspectos, que a raiz da umbanda provinha de antigas religiões e filosofias da Índia.[120][121] Roger Bastide argumentou que o espiritismo "branqueia" ou "europeniza" a umbanda, distorcendo suas raízes africanas.[122] Protestantismo neopentecostal[editar | editar código-fonte]No Brasil, a Umbanda e demais religiões de matrizes africanas sofrem com a intolerância religiosa,[123] sendo as religiões neopentecostais ditas Renovadas de maior intolerância em relação à umbanda, ao candomblé e ao kardecismo.[124] Em 1997, o bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal do Reino de Deus, lançou seu livro "Orixás, Caboclos e Guias - Deuses ou Demônios?" que se tornou leitura obrigatória para evangelicalistas pentecostais, neopentecostais e até mesmo tradicionais.[125] O livro relaciona a religião ao satanismo fundamentando as práticas de exorcismo praticado em sua religião.[125] Em 2005, a Justiça Brasileira determinou a retirada de circulação de todos os exemplares do livro por conta de seu teor preconceituoso contra as religiões afro-brasileiras.[126][127] Mas, um ano depois, o Tribunal Regional Federal da 1ª Região liberou a venda com a justificativa de que a proibição contrariava o princípio da liberdade de expressão, garantido pela Constituição Federal Brasileira.[128] Ala tradicionalista do candomblé[editar | editar código-fonte]Alguns candomblecistas radicais criticam a umbanda por considerá-la superficial e desconhecer os ritos mais profundos dos cultos aos orixás, além de criticarem a umbanda por não separar o culto dos espíritos do culto às entidades, já que o candomblé considera os orixás e deuses como sendo mais puros e de energia mais primordial e que, desse modo, não podem ser maculados pela energia dos espíritos que viveram na Terra.[56] Elogios e Honrarias[editar | editar código-fonte]O Encanto dos Orixás[editar | editar código-fonte]O teólogo da Teologia da Libertação Leonardo Boff, em seu texto "O Encanto dos Orixás", enaltece a religião dizendo que a umbanda representa a verdadeira brasilidade ao misturar em si as raízes africanas, europeias e indígenas além de colocar em primeiro plano os conselhos dos mais humildes e marginalizados.[129] O teólogo pega emprestado o título do livro escrito pelo diplomata e político brasileiro Flávio Miragaia Perri, que se tornou umbandista após conhecer melhor a religião e sua dinâmica. O diplomata escreveu outros livros acerca do tema.[129] Comunidade LGBTQIA+[editar | editar código-fonte]A umbanda é reconhecida e elogiada pela sua abertura à diversidade sexual. Homens e mulheres homossexuais, bissexuais, heterossexuais, transexuais são acolhidos em suas diferenças sem nenhuma distinção.[130] Nos terreiros com maior influência do candomblé, homens e mulheres podem exercer papéis diferentes, mas com dignidade e importância igual.[130] Outro ponto importante é pessoas não heterossexuais terem a possibilidade de tornarem-se pais ou mães de santo, médiuns, cambonos, ogãs e assim por diante sem nenhuma distinção. Muitos casais homossexuais casam-se religiosamente pelas mãos de sacerdotes umbandistas.[130] Patrimônio imaterial[editar | editar código-fonte]Em 2016, após os estudos do Instituto Rio Patrimônio da Humanidade (IRPH), a Umbanda se tornou um dos patrimônios imateriais do Rio de Janeiro.[131] O estudo reconheceu a importância da cultura sincrética afro-indígena brasileira, o sincretismo religioso como mola propulsora de vários aspectos sociais de grande impacto sócio-cultural.[131] Além disso, o Inventário Nacional de Referências Culturais (INRC) está em processo de reconhecimento de vários terreiros de Umbanda como patrimônios históricos em todo o estado do Rio de Janeiro.[132] Ver também[editar | editar código-fonte]
Notas
Referências
Bibliografia[editar | editar código-fonte]
Ligações externas[editar | editar código-fonte]
Qual é o Deus do umbanda?Analogicamente, podemos comparar a crença umbandista à do cristianismo, que tem em Deus o Criador Supremo (Olodumare ou Olorum) e em Jesus o seu maior mistério (sincretizado com Oxalá).
Qual o orixá que representa Deus?Segundo a mitologia iorubá, Olodumaré, também conhecido como Olorum, é o deus supremo e inacessível. Ele criou o mundo e os orixás para governá-lo e servirem de intermediários entre ele e os humanos. Olodumaré não aceita oferendas, pois como é o criador de tudo tem poder sobre tudo e não há nada que ele não possua.
Quem é o criador na umbanda?Há 39 anos morria no Rio de Janeiro, Zélio Fernandino de Moraes, o fundador da Umbanda; religião que tem cerca de 400 mil seguidores no Brasil. A história relata que Zélio Fernandino, aos dezessete anos, teve uma paralisia que os médicos não conseguiam curar.
Quem é o Oxalá?Oxalá é também o nome de um dos orixás mais importantes de cultos afro-brasileiros, como o candomblé. Se trata de uma entidade divina andrógina, que representa as energias da criação da Natureza e personifica o céu.
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