No caso, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença condenatória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento, Show A ação na qual se busca indenização por danos morais – caso dos autos – é tida por “demanda ilíquida”, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto. Tratando-se, portanto, de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta, após o qual, sendo determinado o valor do crédito, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade em recuperação judicial. Interpretação do §1º do art. 6º da Lei n. 11.101/2005. Segundo o caput do art. 49 da Lei n. 11.101/2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. A situação dos autos demonstra que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, bem como a sentença que reconheceu a existência de dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação, ocorreram antes do pedido de recuperação judicial. Na hipótese de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato preexistente ao momento da recuperação judicial, é necessária a sua habilitação e inclusão no plano de recuperação da sociedade devedora. Íntegra do acordão: RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0) RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO EMENTA RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. DISCUSSÃO SOBRE INCLUSÃO DE CRÉDITO EM PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. “DEMANDA ILÍQUIDA”. APLICAÇÃO DO § 1º DO ART. 6º DA LEI N. 11.101⁄2005. CRÉDITO REFERENTE À AÇÃO INDENIZATÓRIA. OBRIGAÇÃO EXISTENTE ANTES DO PEDIDO DE SOERGUIMENTO. INCLUSÃO NO PLANO DE RECUPERAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 59 DA LEI N. 11.101⁄2005. RECURSO PROVIDO. 1. Não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo Civil, pois o eg. Tribunal a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que venha a examinar uma a uma as alegações e os argumentos expendidos pelas partes. Ademais, não se configura omissão quando o julgador adota fundamento diverso daquele invocado nas razões recursais. 2. No caso, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença condenatória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento, submete-se, ou não, aos efeitos da recuperação judicial em curso. 3. A ação na qual se busca indenização por danos morais – caso dos autos – é tida por “demanda ilíquida”, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto. 4. Tratando-se, portanto, de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta, após o qual, sendo determinado o valor do crédito, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade em recuperação judicial. Interpretação do § 1º do art. 6º da Lei n. 11.101⁄2005. 5. Segundo o caput do art. 49 da Lei n. 11.101⁄2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. 6. A situação dos autos demonstra que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, bem como a sentença que reconheceu a existência de dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação, ocorreram antes do pedido de recuperação judicial. 7. Na hipótese de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato preexistente ao momento da recuperação judicial, é necessária a sua habilitação e inclusão no plano de recuperação da sociedade devedora. 8. Recurso especial provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros da QUARTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça acordam, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas, por unanimidade, dar provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Maria Isabel Gallotti (Presidente) e Antonio Carlos Ferreira votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Marco Buzzi. Brasília (DF), 07 de abril de 2016(Data do Julgamento) MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO Relator RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0) RELATÓRIO O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator): 1. Cuida-se de agravo de instrumento interposto por Grupo de Comunicação Três S.A. contra decisão proferida pelo Juízo de primeiro grau, que afastou a submissão do crédito executado – sentença condenatória proferida em autos de ação indenizatória – aos efeitos da recuperação judicial, bem como determinou a intimação da recorrente, na pessoa do advogado, a proceder ao pagamento espontâneo da obrigação, sob pena de multa de 10% (dez por cento), nos termos do art. 475-J do antigo Código de Processo Civil. Ao analisar a controvérsia, o Tribunal de origem negou provimento ao recurso, conforme ementa abaixo transcrita: INDENIZAÇÃO – Incidência dos efeitos da recuperação judicial – Não aplicação do art. 49, da Lei nº 11.101⁄2005 – Constituição do crédito que se deu com a prolação do Acórdão que, inclusive, majorou o quantum indenizatório – Pedido de recuperação judicial que antecedeu a formação do título executivo. Opostos embargos de declaração (fls. 382-383), foram rejeitados (fls. 386-391). Irresignado, Grupo de Comunicação Três S.A. interpõe recurso especial, com base nas alíneas “a” e “c” do permissivo constitucional (fls. 399-426), no qual se alega violação ao disposto nos arts. 47, 49, 51, IX, e 52 da Lei n. 11.101⁄2005 e 398 do Código Civil de 2002. Acena, ainda, pela existência de dissídio jurisprudencial. Inicialmente, destaca que, em 17⁄6⁄2002, a recorrida ingressou com ação indenizatória em face da ora recorrente, objetivando o ressarcimento moral decorrente da veiculação de matéria jornalística publicada na Revista Istoé de 22⁄5⁄2002. Diz que a sentença, proferida em 19⁄5⁄2008, julgou procedente o pedido para condenar a ré ao pagamento de indenização no montante de R$ 30.000,00 (trinta mil reais), cujo valor foi majorado para R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) após o julgamento do recurso de apelação, realizado em 29⁄7⁄2008. Informa que, após a rejeição dos embargos de declaração e a inadmissão dos recursos especial e extraordinário, o recorrido deu início à execução provisória, o qual, segundo o juízo cível, não se submete aos efeitos da recuperação judicial em curso. Feito um breve resumo da demanda, a parte recorrente sustenta a nulidade do acórdão recorrido, pois, não obstante a oposição de embargos de declaração, os vícios apontados não foram sanados. No mérito, assevera que o entendimento do Tribunal a quo é equivocado e extremamente gravoso, uma vez que permite o pagamento de credor fora dos autos da recuperação judicial, criando, assim, privilégio em relação aos demais. Alega que “o caso dos autos versa sobre obrigação constituída com o fato danoso, resultando na condenação da Recorrente na obrigação de pagar ao Recorrido a indenização por danos morais sofridos lá no ano de 2002” e, “por mais que a sentença tenha reconhecido esse dever após a data do pedido de Recuperação Judicial, a obrigação restou contraída com a conduta do Recorrente em ofender o Recorrido” (fl. 416). Pondera que a própria Lei n. 11.101⁄2005 determina que o requerimento de recuperação judicial deve conter a relação de todas as ações existentes naquela data, com a indicação de suas estimativas, sob pena de indeferimento do pedido (arts. 51, X e 52). Explicita, ainda, que é facultado ao credor efetuar o pedido de reserva da importância estimada referente ao crédito a ser inscrito no plano de recuperação. Argumenta que “a partir da circulação da reportagem considerada ofensiva, o Recorrido passou a ser titular de um direito⁄crédito que o legitimou com o ingresso da ação em 17⁄06⁄2012, sendo, pela sentença condenatória, independente da data desta, apenas certificada a existência da ofensa e aplicada as sanções jurídicas que decorreram da norma, não da sentença” (fl. 417). Aduz que a sentença condenatória é constitutiva da sanção ou do estado de sujeição aos atos de execução, tendo em vista que a sua executividade decorre da circunstância de se tratar de uma norma jurídica individualizada. Defende que “pela interpretação sistemática da norma, a data da sentença – que quantificou o direito⁄crédito do Recorrido e lhe facultou a execução – é irrelevante, pois o ato que constituiu o crédito é anterior à Recuperação, assim como a data da propositura da ação indenizatória idem, e estes sim, já existiam ao tempo do pedido” (fls. 419-420). Contrarrazões ao recurso especial às fls. 444-449. Crivo positivo de admissibilidade na origem (fls. 461-463). É o relatório. RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0) RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. NÃO OCORRÊNCIA. DISCUSSÃO SOBRE INCLUSÃO DE CRÉDITO EM PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. “DEMANDA ILÍQUIDA”. APLICAÇÃO DO § 1º DO ART. 6º DA LEI N. 11.101⁄2005. CRÉDITO REFERENTE À AÇÃO INDENIZATÓRIA. OBRIGAÇÃO EXISTENTE ANTES DO PEDIDO DE SOERGUIMENTO. INCLUSÃO NO PLANO DE RECUPERAÇÃO. VIOLAÇÃO AO ART. 59 DA LEI N. 11.101⁄2005. RECURSO PROVIDO. 1. Não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo Civil, pois o eg. Tribunal a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que venha a examinar uma a uma as alegações e os argumentos expendidos pelas partes. Ademais, não se configura omissão quando o julgador adota fundamento diverso daquele invocado nas razões recursais. 2. No caso, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença condenatória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento, submete-se, ou não, aos efeitos da recuperação judicial em curso. 3. A ação na qual se busca indenização por danos morais – caso dos autos – é tida por “demanda ilíquida”, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto. 4. Tratando-se, portanto, de demanda cujos pedidos são ilíquidos, a ação de conhecimento deverá prosseguir perante o juízo na qual foi proposta, após o qual, sendo determinado o valor do crédito, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade em recuperação judicial. Interpretação do § 1º do art. 6º da Lei n. 11.101⁄2005. 5. Segundo o caput do art. 49 da Lei n. 11.101⁄2005, estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. 6. A situação dos autos demonstra que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, bem como a sentença que reconheceu a existência de dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação, ocorreram antes do pedido de recuperação judicial. 7. Na hipótese de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato preexistente ao momento da recuperação judicial, é necessária a sua habilitação e inclusão no plano de recuperação da sociedade devedora. 8. Recurso especial provido. VOTO O SENHOR MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO (Relator): 2. De início, verifica-se que não há falar em violação ao art. 535 do Código de Processo Civil, pois o Eg. Tribunal a quo dirimiu as questões pertinentes ao litígio, afigurando-se dispensável que venha examinar uma a uma as alegações e os fundamentos expendidos pelas partes. Basta ao órgão julgador que decline as razões jurídicas que embasaram a decisão, não sendo exigível que se reporte, de modo específico, a determinados preceitos legais. Além disso, não significa omissão o fato de o julgador adotar outro fundamento que não aquele perquirido pela parte. No caso dos autos, a tese jurídica sobre a possibilidade de submissão do crédito ao plano de recuperação judicial foi amplamente debatido no aresto impugnado, razão pela qual não procede o argumento sobre a existência de omissão a respeito da incidência dos arts. 6º, 47, 51, 52 e 59 da Lei n. 11.101⁄2005 (LFR). Nesse sentido, confiram-se os seguintes precedentes: (1) AgRg no AREsp 704.658⁄RJ, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 8⁄3⁄2016, DJe 14⁄3⁄2016; (2) AgRg no REsp 1564178⁄RN, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 8⁄3⁄2016, DJe 17⁄3⁄2016; (3) AgRg no AREsp 827.039⁄MG, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 15⁄3⁄2016, DJe 17⁄3⁄2016; (4) AgRg no REsp 1300894⁄RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 10⁄3⁄2016, DJe 16⁄3⁄2016; (5) AgRg no REsp 961.709⁄RJ, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 9⁄3⁄2010, DJe 23⁄3⁄2010. 3. Ultrapassada a preliminar, verifica-se que a controvérsia principal está em definir se o crédito decorrente de sentença condenatória, proferida em autos de ação indenizatória ajuizada antes do pedido de soerguimento, submete-se, ou não, aos efeitos da recuperação judicial em curso. Na parte que interessa, o acórdão recorrido assim dispôs: O recurso não merece acolhimento. 4. Nesse passo, a meu ver, a solução do caso exige a análise conjunta e sistemática de diversos dispositivos previstos na Lei n. 11.101⁄2005 (LFR). Segundo o inciso III do art. 51 da LFR, a petição inicial do pedido de recuperação judicial deve ser instruída com a relação nominal dos credores, indicando-se a sua natureza e classificação, o valor atualizado do crédito e os regimes dos respectivos vencimentos. Além disso, o requerimento deve conter “a relação, subscrita pelo devedor, de todas as ações judiciais em que este figure como parte, inclusive as de natureza trabalhista, com a estimativa dos respectivos valores demandados” (art. 51, IX, da LFR). Por sua vez, o art. 6º regula a suspensão de todas as ações em face do devedor em recuperação judicial ou em processo de falência, determinando o prosseguimento de todas aquelas que demandarem quantia ilíquida, in verbis: Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor,
inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário. Em outras palavras, a suspensão do curso de ações e execuções individuais não alcança as demandas que versarem sobre quantia ilíquida, ou seja, aquelas que dependem de prévia apuração para se definir o valor do crédito. Mauro Rodrigues Penteado, em livro coordenado por Franscisco Satiro de Sousa Junior e Antônio Sérgio A. de Moraes Pitombo, explica a finalidade da norma: É desnecessário reiterar o que já foi dito acerca da ratio essendi do ditado legal, em última análise voltado à economia processual e à natureza do juízo universal, que é procedimento de execução coletiva, na falência, ou de quantificação de valores líquidos que oneram o patrimônio do devedor, na recuperação judicial, a fim de que possa ser avaliada a viabilidade do respectivo plano, tendo em mira sua concessão. Lógica, portanto,
a solução de manter as ações nos juízos de origem, até que sejam apurados os créditos devidos, para inclusão no Quadro-Geral de Credores. Por isso que, em tais casos (§ 1º), a lei defere a possibilidade de o juízo determinar a reserva de importância que estimar devida na recuperação judicial ou na falência e, após reconhecido o direito e a sua liquidez, haverá a inclusão do crédito na classe própria, observando-se, assim, eventual ordem de privilégio (§ 1º do art. 6º). Nesse sentido também é a lição da doutrina: Tratando-se de título ilíquido, estamos diante de um direito ainda não totalmente adquirido. É o caso do trabalhador que, ao tempo da quebra da empresa, estava promovendo ação contra esta da Justiça do Trabalho. O
processo falimentar segue seu curso normal, e pode haver venda de bens, com pagamento, inclusive de credores trabalhistas, enquanto sua causa trabalhista continua tramitando, ainda sem decisão, ou com recurso. Neste caso ele tem um crédito ilíquido, ainda não apurado por sentença. Isto é, não dispõe do título judicial. Assim, deverá o credor pedido a reserva de seu crédito no juízo trabalhista, para que ele determine, por ofício, a reserva no juízo da falência, na forma do § 3º do art. 6º. O
mesmo se aplica às ações que tramitem em outros juízos, conforme o § 1º deste artigo. Apesar de os credores dessas ações não disporem do título judicial, nenhum prejuízo sofrerão se, tempestivamente, fizerem a reserva a que alude o § 3º retrocitado. Observa-se, ademais, que a ação na qual se busca indenização por danos morais – caso do autos – é tida por “demanda ilíquida”, pois cabe ao magistrado avaliar a existência do evento danoso, bem como determinar a extensão e o valor da reparação para o caso concreto. Dessa forma, verifica-se que, durante o trâmite do processo de recuperação judicial, haverá o prosseguimento da ação na qual se busca indenização por dano moral. Após, sendo determinado o valor, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade devedora. Com essa mesma linha de raciocínio, Sérgio Campinho explica que “as ações que demandarem quantia ilíquida não serão suspensas e prosseguirão, no juízo de seu processamento, até que as importâncias perseguidas se tornem líquidas, ocasião em que os respectivos créditos serão incluídos no quadro-geral de credores, nas classes que lhe forem próprias” (CAMPINHO, Sérgio. Falência e recuperação de empresa. Rio de Janeiro: Renovar, 2009, p. 150). Em diversos julgados desta Corte Superior, especialmente em sede de conflito de competência, ficou assentada a necessidade de permanência da “demanda ilíquida” no juízo em que estiverem sendo processadas e, após a apuração do valor correspondente, submete-se aos efeitos da recuperação judicial, in verbis: __________ A título de reforço argumentativo, a LFR exige que, além da verificação periódica em cartórios de distribuição, todas as ações propostas em face do devedor deverão sejam comunicadas ao juízo concursal, sendo tal incumbência do respectivo magistrado e do próprio devedor, quando do recebimento da petição inicial e da citação, respectivamente (art. 6º, I e II, da LFR). A ideia, portanto, que se apreende do sistema legal da recuperação, é a necessidade de controle que o juízo deve ter sobre o trâmite de todas as ações ajuizadas contra o devedor e a ciência daquelas demandas propostas após a formulação do pedido de soerguimento. Ora, se essas ações propostas antes do pedido de recuperação judicial – ainda que ilíquidas em momento anterior – não fossem contempladas no plano de recuperação, inexistiria razão para a lei determinar que o pedido de soerguimento apresentasse a relação de todas as demandas ajuizadas, com a explicitação da estimativa dos valores discutidos em juízo. Acrescente-se, como já dito, a possibilidade de o juízo, onde estiverem sendo processadas as “ações ilíquidas”, determinar a reserva de valor para a satisfação da obrigação reconhecida judicialmente. Como arremate, a própria lei determina que, após a apuração do valor devido nos autos da “ação ilíquida”, o crédito decorrente da sentença judicial será incluído na classe própria do quadro geral de credores. Não se quer, desse modo, que haja execuções paralelas, com o intuito de haver pagamento fora do plano aprovado pela Assembleia Geral de Credores. Assim, diante de todos os dispositivos acima analisados e dos argumentos expendidos, penso que o crédito discutido nos autos, decorrente de demanda ilíquida proposta antes do deferimento da recuperação judicial, deve se submeter aos seus efeitos. 5. Convém esclarecer, é bem verdade, que o caput do at. 49 da LFR disciplina que somente os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos, estarão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial, in litteris: Art. 49. Estão sujeitos à recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido, ainda que não vencidos. Infere-se do dispositivo acima transcrito que estão sujeitos à recuperação judicial e, portanto, aos seus efeitos, todos os créditos existentes até a data em que protocolizado o pedido de recuperação judicial. Em contrapartida, se a constituição do crédito for posterior, fica afastada a aplicação do regime concursal. Fábio Ulhoa Coelho faz as seguintes considerações acerca da questão: A recuperação atinge, como regra, todos os credores existentes ao tempo da impetração do benefício. Marcos Andrey de Sousa também não vacila ao afirmar que: O primeiro aspecto a observar é o marco temporal, qual seja, a data do pedido. Os credores posteriores
ao pedido não podem ser incluídos no plano de recuperação, mesmo que este seja elaborado e apresentado posteriormente. De fato, se analisada a questão também pelo ângulo da doutrina civilista, o resultado não pode ser outro. É que, presente a responsabilidade civil extracontratual – caso do autos -, a obrigação de indenizar surge com a configuração do evento danoso. Por isso que o art. 927 do Código Civil de 2002 dispõe que a violação do direito, aliado ao dano, rende ensejo ao dever de reparar. Percebe-se que a “violação do direito” e o “dever de reparar” são fatos jurídicos que surgem simultaneamente. Acerca da questão, Sérgio Cavalieri Filho destaca que “a responsabilidade civil opera a partir do ato ilícito, com o nascimento da obrigação de indenizar, que tem por finalidade tornar indemne o lesado, colocar a vítima na situação em que estaria sem a ocorrência do fato danoso” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. São Paulo: Atlas, 2014, p. 16). Por isso que Arnaldo Rizzardo ensina que “a prática de um ato ilícito determina o ressarcimento dos danos, o que se verifica com a reposição das coisas em seu estado anterior” (RIZZARDO, Arnaldo. Responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 53). Nessa mesma linha de intelecção, Rui Stoco, de forma bem sintética, também ensina que “da prática do ato ilícito decorre a responsabilidade do agente” e, em seguida, diz que, a partir do ato gerador do dano, “nasce a obrigação de indenizar ou compensar” (STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2014, p. 191). Com idêntico enfoque, Flávio Tartuce pondera que “a responsabilidade civil surge em face do descumprimento obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por deixar de observar um preceito que regula a vida (TARTUCE, Flávio. Direito das obrigações e responsabilidade civil. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2015, p. 319). Desse modo, ao prejudicado pelo ato ilícito assiste o direito de exigir uma importância destinada a reequilibrar a sua posição jurídica, revelando o caráter pecuniário do ressarcimento decorrente da responsabilidade civil extracontratual. Dessarte, com o ato ilícito surge o direito de crédito, cuja quantificação caberá às partes, em comum acordo, ou ao magistrado, por meio de ação indenizatória. Em outras palavras, se o fato (dano) ocorreu, fica postergado a outro momento apenas a mensuração da extensão do infortúnio causado à vítima. A fixação do valor é protraído no tempo, mas o dever jurídico de indenizar nasce com o evento danoso. Outrossim, não se olvide que, se houver resistência do agente responsável pelo dano, caberá a intervenção do Poder Judiciário, que declarará uma situação jurídica preexistente (ato gerador do dano) e o condenará ao pagamento da indenização, seja de ordem moral, material ou estética (extensão do dano). Nesse caso, é a partir da sentença que há o dimensionamento do valor, que se torna líquido. Portanto, o crédito constituído depois de iniciado o processo de recuperação, mas decorrente de sentença ilíquida anterior, deve mesmo constar do plano. É por tal razão, vale gizar novamente, que, durante o trâmite do processo de recuperação judicial, haverá o prosseguimento da ação na qual se busca indenização por dano moral. Após, sendo determinado o valor, deverá ser habilitado no quadro geral de credores da sociedade devedora. No caso em análise, observa-se que o evento danoso, que deu origem ao crédito discutido, ocorreu antes do pedido de recuperação judicial. Por sua vez, a sentença que declarou a existência do dano moral indenizável e dimensionou o montante da reparação também foi proferida em momento anterior ao pedido de soerguimento. Assim, a meu ver, o crédito já estava constituído antes do início do processo de recuperação judicial, razão pela qual deve ser habilitado no quadro geral de credores. Apenas o trânsito em julgado ocorreu posteriormente. Essa linha de raciocínio está coerente com o acórdão proferido do AgRg no AREsp n. 153.820⁄SP, da Terceira Turma deste Tribunal, segundo o qual, no caso de crédito decorrente de responsabilidade civil, oriundo de fato preexistente ao momento do pedido de recuperação judicial, deve ocorrer sua inclusão e habilitação no quadro geral de credores da sociedade devedora, nos termos da ementa abaixo colacionada: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. COMPROVAÇÃO DE TEMPESTIVIDADE DO RECURSO ESPECIAL EM SEDE DE AGRAVO REGIMENTAL. SUSPENSÃO DO EXPEDIENTE FORENSE. RECESSO. VIOLAÇÃO DO ART. 170 DA CF⁄88. MATÉRIA CONSTITUCIONAL. NÃO CABIMENTO. CONTRARIEDADE AOS
ARTIGOS 47 E 49 DA LEI N. 11.101⁄05. DIVERGÊNCIA JURISPRUDENCIAL. CRÉDITO REFERENTE À INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. HABILITAÇÃO. CABIMENTO. NEGATIVA DE VIGÊNCIA AO ART. 59 DA LEI N. 11.101⁄05. NOVAÇÃO. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA N. 282⁄STF. INCIDÊNCIA. É possível constatar, do precedente acima invocado, que o recurso envolve a mesma parte recorrente e apresenta suporte fático bem semelhante, inclusive com a existência de sentença condenatória quando da apresentação do pedido de soerguimento, in verbis: II) Contrariedade aos arts. 47 da Lei n. 11.101⁄05 e divergência jurisprudencial Por fim, é válido consignar que essa discussão difere daquela travada nos autos do Conflito de Competência n. 129.720-SP, no qual fiquei vencido, oportunidade em que a Segunda Seção firmou o entendimento retratado na ementa abaixo colacionada: CONFLITO DE COMPETÊNCIA – CRÉDITO TRABALHISTA CONSTITUÍDO APÓS O DEFERIMENTO DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL – ATO
EXPROPRIATÓRIO ORDENADO PELO MAGISTRADO LABORAL GENÉRICO E SEM QUALQUER RESSALVA – ANTE A ESPECIFICIDADE DO CASO, COMPETE AO JUÍZO UNIVERSAL AVALIAR ACERCA DA ESSENCIALIDADE OU NÃO DO BEM AO FUNCIONAMENTO DA EMPRESA – PRECEDENTES DO STJ. É possível extrair notórias diferenças do contexto fático, pois: (1) o crédito é oriundo de reclamação trabalhista e (2) a própria ação judicial foi proposta anos após o pedido de recuperação judicial. Por tais razões, o colegiado chegou a conclusão de que “o crédito constituído e ora executado é posterior ao deferimento do benefício recuperacional”. Nesse contexto, transcreve-se o pertinente trecho da fundamentação apresentada pelo em. Ministro relator para o acórdão: Assim, a solução inicialmente apresentada
pelo ilustre relator quanto ao prosseguimento do processo executivo, é a que melhor se amolda à exegese do comando normativo contido no art. 49, da Lei n.º 11.101⁄2006, porquanto, inobstante a recuperação judicial encontrar legalmente abrigo sob o manto do princípio geral da proteção e da preservação da empresa, o Poder Judiciário não pode consagrá-la como fonte de descumprimento de obrigações assumidas, razão pela qual, em respeito e observância ao disposto no art. 49 da Lei n.º 11.101⁄2005,
apenas os créditos existentes, ou seja, efetivamente constituídos, até a data do pedido estão sujeitos à recuperação judicial. […] 6. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para determinar a inclusão do crédito discutido nos autos no plano de recuperação judicial. É como voto. CERTIDÃO DE JULGAMENTO Números Origem: 0018962 00538282820118260000 18962 5830020021124992 PAUTA: 07⁄04⁄2016 JULGADO: 07⁄04⁄2016 Relator Presidente da Sessão Subprocurador-Geral da
República Secretária AUTUAÇÃO RECORRENTE : GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S⁄A – EM RECUPERAÇÃO JUDICIAL ASSUNTO: DIREITO CIVIL – Responsabilidade Civil – Indenização por Dano Moral SUSTENTAÇÃO ORAL Dra. LUCIMARA FERRO MELHADO, pela parte RECORRENTE: GRUPO DE COMUNICAÇÃO TRÊS S⁄A CERTIDÃO Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Quarta Turma, por unanimidade, deu provimento ao recurso especial, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0) VOTO MINISTRA MARIA ISABEL GALLOTTI: Senhores Ministros, cumprimento a bela sustentação oral feita pela advogada, o voto tão esclarecedor do Senhor Ministro Luis Felipe Salomão. RECURSO ESPECIAL Nº 1.447.918 – SP (2014⁄0081270-0) VOTO-VOGAL O SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO: Cumprimento a ilustre advogada, Doutora Lucimara Ferro Melhado, pela sustentação oral que nos apresentou, o eminente representante do Ministério Público por seu judicioso Parecer e o eminente Ministro Relator, que nos traz, como sempre, um excelente voto. Data: 09/06/2016 Fonte: www.leidefalencias.com.br O que acontece com uma empresa que entra em recuperação judicial?Se aprovado, a empresa entra em processo de recuperação. Se não for aprovado, o juiz decreta a falência da empresa. A negociação entre as partes é intermediada por um administrador judicial nomeado pela Justiça.
Onde deve ser feito o pedido de recuperação judicial?O pedido de recuperação judicial deve ser protocolado em uma Vara de Falências. É nela que a empresa oficializa seu pleito, apresentando os documentos já citados no tópico sobre a fase postulatória e outros conforme o caso.
Quais são os sujeitos que não pode entrar com o pedido de recuperação judicial?1) Não se submeterá aos efeitos da recuperação judicial créditos oriundos de credor titular da posição de proprietário fiduciário de bens móveis ou imóveis, de arrendador mercantil, de proprietário ou promitente vendedor de imóvel cujos respectivos contratos contenham cláusula de irrevogabi- lidade ou irretratabilidade ...
O que é juízo da recuperação judicial?A recuperação judicial é um procedimento que permite a empresas – de todos os tamanhos – renegociar dívidas e suspender prazos de pagamento. Por meio dela, as companhias podem discutir junto aos credores uma saída para eventuais crises econômico-financeiras.
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